Quando se pensa no modelo de uma escola ideal, imediatamente fazemos associações com o projeto pedagógico, a organização do currículo, a formação dos professores, o espaço físico e até mesmo a alimentação. Tudo isso deve ser considerado.

No entanto, para o doutor em neurociência Fernando Louzada, professor da Universidade Federal do Paraná, essa lista também deve levar em conta o tempo biológico de cada aluno e o sono. Sim, o descanso também é importante para aprender.

De acordo com o doutor em neurociência, muitos não dão importância para o sono, mas há quase um consenso entre os pesquisadores de que a atividade cerebral que acontece durante esse período tem ligação com a consolidação do aprendizado.

As possiblidades de simulações que acontecem durante o sono também abrem espaço para a criatividade e o despertar de insights.

“Assim como a escola se preocupa com a alimentação dos alunos, ela deve pensar da mesma forma com o sono”, defende em entrevista ao Porvir, quando ressalta a necessidade de reorganizar horários escolares de forma a considerar essas necessidades.

“Os alunos aprendem de maneiras diferentes e com ritmos diferentes. Mas quando se pensa nas diferenças temporais, as pessoas não conseguem enxergar da mesma maneira”, explica Louzada.

Segundo ele, os educadores precisam saber que os alunos possuem ritmos biológicos diferentes. “Isso também deveria ser pensado no âmbito da personalização do ensino”, afirma.

Ao contrário do que muitos acreditam, nem sempre horário tardio para dormir e despertar de uma criança ou adolescente está associado à falta de limites.

Existe uma área da biologia que é responsável por estudar e mostrar essas diferenças temporais a partir de uma influência genética. Conforme aponta a cronobiologia, cada pessoa tem um tempo diferente.

Um aluno considerado matutino, por exemplo, apresenta preferência por acordar cedo e sente mais disposição nesse período.

Já para um vespertino, é difícil levantar nas primeiras horas do dia. “Isso faz parte da organização dos relógios biológicos desses alunos”, afirma o pesquisador.

Muitas escolas acreditam que as crianças e adolescentes conseguem se acostumar a dormir e acordar cedo. Porém, o doutor em neurociências afirma que um aluno vespertino nunca vai mudar o seu comportamento natural. “Ele vai conseguir se ajustar porque o nosso sistema nervoso é plástico.

Ele vai até dormir mais cedo, só que toda vez que tiver a oportunidade, vai expressar a sua preferência em deitar e acordar mais tarde”, explica.

A escola deveria apresentar opções de horários para atender tanto aos alunos matutinos quanto aos vespertinos, conforme aponta Louzada.

Durante a segunda reunião da Rede CpE, que aconteceu na última segunda-feira (27), na sede do Instituto Ayrton Senna, em São Paulo, o doutor em neurociências apresentou uma ideia do que seria um modelo de escola ideal. Essa proposta sugere um horário de atividades comum entre os alunos, das 9 às 12h, e a opção de escolher entre as outras aulas no período das 7 às 9h ou das 13 às 15h.

“Dormir e reorganizar os horários escolares para respeitar essas preferências não gera custos. Existe um preconceito por trás disso e uma ideia de que todo mundo consegue se adaptar.”

No entanto, antes de fazer qualquer alteração nos horários, o pesquisador diz que é necessário consultar professores, alunos, pais e a comunidade em geral.

“Dentro da realidade e a proposta pedagógica da escola, você começa a discutir como seria esse modelo. O que eu estou propondo é apenas um exemplo de como se poderia ser feito”, afirma.

Sono também é importante depois de um aprendizado

Não restam muitas dúvidas de que o descanso é importante antes de um aprendizado, já que os efeitos de privação de sono podem reduzir a capacidade de atenção e provocam alterações de humor. “O dormir antes talvez seja mais evidente e mais fácil de observar”, comenta Louzada.

No entanto, as pesquisas das últimas décadas também passaram a considerar o papel do sono depois de aprender, ou até mesmo durante os pequenos cochilos, chamados de sesta.

Uma pesquisa desenvolvida no Laboratório de Cronobiologia Humana, da Universidade Federal do Parará, investigou o sono durante o intervalo de uma atividade.

Um grupo de estudantes foi convidado a jogar o game Speedy Eggbert, que envolve a resolução de problemas em diferentes níveis. Entre as fases do jogo, uma parte do grupo foi colocada para dormir durante uma hora e meia.

Os resultados mostraram que 12 participantes, entre os 14 que dormiram, conseguiram resolver o desafio. No grupo que ficou acordado, esse número caiu para sete, de 15 indivíduos.

Pelo menos até os 6 ou 7 anos, o doutor em neurociências defende que a escola tenha um espaço dedicado para a sesta. “As crianças vão fazer opção se querem dormir ou ficar acordadas.

Algumas não sentem mais a necessidade da sesta por conta do amadurecimento do sistema nervoso. Mas, precisamos permitir que as crianças durmam.”