Diálogo e medidas educativas diante de desacato e desobediência também estão previstos em regime interno e programa contra evasão e violência nas escolas.

Em escola que pune aluno infrator, crianças já tiveram de limpar paredes
Alunos da escola Fauze Scaff Gattass, em sala de aula na tarde desta-feira (09). Vandalismo é reparado pelo próprio autor. / Foto: Anahi Gurgel

Polêmica, a "Lei Harfouche", que vem dividindo opiniões na Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, ainda causa confusão até mesmo nas escolas da rede pública de Campo Grande, onde vigora há 2 anos. 

Alunos que picham ou sujam paredes, furtam objetos, agridem fisica e verbalmente colegas e professores ou cometem outros atos de indisciplina no ambiente escolar estão sujeitos às penalidades da lei 8.062, de 2015, que prevê medidas educacionais em casos de infrações cometidas por alunos dentro das escolas da Reme (Rede Municipal de Ensino).

Entretanto, sua aplicação ainda está permeada de dúvidas porque suas diretrizes se integram ao regimento interno da Reme e ao ProCEV (Programa de Conciliação para Prevenir a Evasão e a Violência) - este último também proposto pelo procurador Sérgio Harfouche, assim como a lei.

Poucos exemplos de situações em que a legislação foi posta em prática foram relatados pela Semed (Secretaria Municipal de Educação), que indicou apenas uma escola para a reportagem do Campo Grande News.

"Em abril deste ano, um aluno de 12 anos foi encontrado com um pincel atômico rabiscando toda a parede do banheiro masculino. Fazia alguns dias que estávamos encontrando a pichação, mas ninguém sabia quem era o autor, até que ele foi flagrado”, conta Tânia Vital da Silva Gomes, há 12 anos diretora da Escola Municipal Fauze Scaff Gattass Filho, no Bairro Nova Campo Grande.

A primeira providência foi conversar com o estudante, orientá-lo em relação à indisciplina e depois entrar em contato com os pais. “Eles compreenderam a situação e concordaram que o dano fosse reparado pelo próprio filho, como prevê a lei municipal. O garoto veio limpar a parede no sábado, dia 22, sem que os colegas estivessem na instituição”, diz.

No mesmo dia em que o autor foi “descoberto”, uma colega de sala de 12 anos confessou que também havia cometido o vandalismo na parede da sala de aula. Os mesmos procedimentos foram tomados, com diálogo entre a garota e os pais e, posteriormente, limpeza da área também em um final de semana.

“Em caso de vandalismo, por exemplo, o reparo pelo estudante deve ser realizado no contraturno escolar, com duração de até 2 horas e sem expor o autor a situações vexatórias”, explica Maria Olívia Fernandes, técnica da Superintendência de Gestão e Normas da Semed (Secretaria Municipal de Educação).

“Tivemos casos mais extremos, de alunos que agrediam constantemente os colegas e, por mais que buscássemos o diálogo com a família, não houve acordo. Infelizmente, foi necessário transferir o aluno para outra unidade, que é a medida mais extrema prevista no regimento interno da rede municipal”, acrescenta a diretora.

“Tripé pedagógico” - O regimento interno da rede municipal de ensino, segundo Tânia, foi atualizado há cerca de 7 anos, quando incorporou as premissas do ProCEV, implantado na Capital e outros municípios de Mato Grosso do Sul a partir de 2010.

Tânia foi questionada se as medidas "punitivas" aplicadas no aluno que pichou a escola seriam tomadas mesmo se a lei municipal não fosse sancionada. 

“Ações educativas e pedagógicas já estão previstas no regimento interno, que inclui as diretrizes do programa contra evasão e violência escolar. Todas essas ferramentas preconizam o diálogo entre infratores e familiares, mas sem a lei municipal talvez eu não teria segurança para sugerir que o aluno indisciplinado limpasse a parede pichada”, respondeu. 

“Antes, não tínhamos esse amparo e alguns pais até ameaçavam abrir processo na justiça contra a escola”, lembra.

O ProCEV e o regime interno da Reme têm o objetivo de fomentar a solução de conflitos decorrentes de atos de indisciplina escolar em sua origem, evitando a judicialização de condutas contrárias às normas escolares. Ambos possuem amparo legal na Constituição Federal, Estatuto da Criança e do Adolescente e Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.