Mesmo com montante recebido por meio de programa do Ministério da Saúde e dívida ativa de R$ 338,8 mil, a Missão Caiuá tem mais R$ 213 milhões para receber neste ano.

Mesmo com montante recebido por meio de programa do Ministério da Saúde e dívida ativa de R$ 338,8 mil, a Missão Caiuá tem mais R$ 213 milhões para receber neste ano
Indígenas em 2021, durante protesto pela falta de atendimento de saúde; movimento aconteceu no DSEI-MS. / Foto: Bruno Henrique/Arquivo/Correio do Estado

Após diversas matérias do Correio do Estado denunciarem que, ao longo de nove anos, a ONG Missão Evangélica Caiuá, que tem sede em Dourados, faturou R$ 432 milhões com a saúde indígena em Mato Grosso do Sul, durante a primeira sessão legislativa em MS, o deputado Zeca do PT anunciou que vai propor uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar a Missão Caiuá. 

A organização já é alvo de denúncias por suspeita de desvio de dinheiro destinado à saúde indígena. Além disso, diversas inconsistências foram encontradas na prestação de contas da Missão Caiuá.

De acordo com o portal da Transparência do governo federal, os primeiros contratos são de fevereiro de 2014 – 19 ao todo. Desde então, a entidade, que atende diversas regiões do País com a contratação de profissionais para atuar na saúde indígena, vem acumulando centenas de outros contratos.

Para atender todo o Brasil, a ONG de Dourados já recebeu R$ 2,9 bilhões, valor contabilizado de 2014 a 2022. Desse montante, só para MS vieram R$ 423.010.668,81, por meio do Programa de Proteção e Promoção dos Direitos dos Povos Indígenas.

Mesmo com esses recebimentos, conforme pesquisa na Receita Federal, a entidade está inscrita na dívida ativa, com saldo devedor de R$ 338.872,30 em apenas um de seus CNPJs, o de Dourados.

Diante desse cenário, o deputado estadual Zeca frisou a importância de investigar a organização, a fim de evitar o possível desvio de recursos e desassistência às comunidades indígenas. 

“É papel da Assembleia [Legislativa] aprofundar a discussão a respeito da história dos recursos que vêm para a Missão Caiuá. A ONG está instalada em Dourados, recebendo, nos últimos anos, R$ 432 milhões para saúde indígena, e qualquer um de nós que vai em uma aldeia, como eu vou, vê que não tem sequer uma dipirona para tratar a dor, muito menos assistência médica ou qualquer outro tipo de tratamento”, destacou o deputado, durante a solenidade. 

Ao Correio do Estado, Zeca do PT afirmou que pretende propor a CPI o quanto antes, para que o caso seja investigado e tratado com a maior celeridade possível. 

“Já pedi para a nossa assessoria jurídica estudar o caso para propormos a CPI o mais rápido possível. Vou precisar recolher assinaturas e contar com o apoio da Assembleia. Acho fundamental os deputados entrarem nesse debate, queremos saber para onde esse dinheiro está indo de fato”, afirmou o deputado. 

REPASSES
A ONG Missão Caiuá tem mais R$ 213 milhões para receber ainda este ano de contratos com o Ministério da Saúde. A verba, em tese, é destinada para ações que promovam a saúde indígena. 

Em entrevista ao Correio do Estado na semana passada, o líder da Aldeia Bororo, Reinaldo Arevalo, afirmou que o dinheiro não é bem administrado pelos responsáveis, já que, no local e na Aldeia Jaguapiru, ambas em Dourados, que deveriam ser atendidas pela entidade, não há medicamentos ou acesso à saúde básica. 

“Nossa saúde aqui está precária, no posto de saúde não tem nada de medicamento. Estamos sem viatura e sem telefone para ligar no polo-base de Dourados”, disse Reinaldo Arevalo, conhecido como Dinho, capitão da Aldeia Bororo.

Já os líderes da Aldeia Jaguapiru informaram que os valores não chegavam ao local, que também passa por dificuldades de acesso à saúde, a remédios e à água potável. 

A Missão Caiuá informou, por meio de nota, na semana passada, que atua apenas de forma complementar na saúde indígena, com a única obrigação de contratar profissionais de saúde, que ficam à disposição do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI-MS).

“Atualmente, temos mais de 700 profissionais contratados só aqui em MS, e estes ficam à disposição do governo federal e compõem as equipes de saúde indígena”, disse a entidade.

A ONG acrescentou que o convênio não é responsável por outras despesas, como alimentos, remédios, transporte, entre outros. “Paralelo a isso, a entidade tem um hospital [Hospital Porta da Esperança] ao lado das aldeias em Dourados e atende de forma gratuita todos os indígenas [atendimento básico e primário]”.

A organização também reforçou que vive de doações, e que os recursos recebidos para o hospital e pelos convênios não podem ser direcionados para a compra de alimentos.