Mapa da propina: dinheiro desviado pode ter comprado 26 fazendas
Parte do material recolhido pela PF durante busca e apreensão na Operação Fazendas de Lama. / Foto: Divulgação / PF

A Operação Lama Asfáltica, em suas duas fases, já desvendou que parte do dinheiro desviado das obras executadas pelas empresas da “organização criminosa” era usado na compra ou arrendamento de fazendas. São mais de 67 mil hectares de propriedades rurais, segundo o que foi apurado até agora. Na primeira fase, deflagrada no dia 9 de julho do ano passado, só das fazendas registradas em nomes das filhas e das empresas da família de João Alberto Krampe Amorim dos Santos, foram identificadas 11 propriedades, e outras cinco em situação suspeita.

Para escapar da fiscalização dos órgãos de controle, especialmente a Receita Federal, a organização usava de estratégias como doações ou empréstimos a familiares que acabavam parando nas contas das pessoas que venderam as propriedades, ou então aquisição em nome de terceiros, na maioria das vezes mulheres e filhas dos investigados.

Após análise e perícia nos documentos apreendidos na Lama Asfáltica (1ª fase), descobriu-se que algumas fazendas foram adquiridas em nome da empresa Idalina Patrimonial, que tem como sócias as três filhas de João Amorim que foram presas temporariamente na Operação Fazendas de Lama, realizada no último dia 10: Ana Paula Amorim Dolzan, Ana Lúcia Amorim e Renata Amorim Agnoletto. Dessas, apenas Ana Paula continua presa preventivamente, mas cumpre em regime domiciliar no Rio Grande do Sul, onde também tem casa.

Também foram compradas fazendas em nome da empresa Areias Patrimonial, que tem como sócios, além das três filhas de João Amorim, a mulher dele, Tereza Cristina Pedrossian Cortada Amorim e a irmã dele, a deputada estadual Maria Antonietta Amorim.

Conforme a representação apresentada à Justiça Federal para os pedidos de prisão temporária e de mandados de busca e apreensão cumpridos no último dia 10, em documentos apreendidos na Operação Lama Asfáltica foi encontrado documentos sobre a compra, em dezembro de 2014, da Fazenda São Lucas, em Anastácio, pelo valor de R$ 3,3 milhões, pela Idalina Patrimonial.

De acordo com a representação feita pela PF (Polícia Federal), entre os documentos apreendidos na operação do ano passado, estão quatro pastas referentes as fazendas do grupo de João Amorim. Em uma das pastas, foi encontrado contrato de compra da Fazenda Jacaré de Chifre, em Porto Murtinho - a 431 km de Campo Grande. A Idalina Patrimonial pagou R$ 30 milhões em sete parcelas.

Os peritos detectaram que a primeira parcela, no valor de R$ 5,5 milhões, vencida em 03/05/2010, teria sido pago da conta bancária de João Amorim, dono da Proteco, tido pelos investigadores como a principal empresa da organização, por onde entrava a maior parte do dinheiro desviado das obras. A segunda parcela, vencida em 15/02/2011, no valor atualizado de R$ 1,6 milhão, teria sido paga com recursos da conta da empresa Socenge, que passou a se chamar LD Construções, que tem como sócio Luciano Dolzan, marido de Ana Paula, genro de João Amorim.

Mapa da propina: dinheiro desviado pode ter comprado 26 fazendas

Os técnicos responsáveis pela análise dos documentos descobriram que a família Amorim realizava uma verdadeira manobra financeira para evitar a fiscalização. Mas as coincidências nos valores das movimentações financeiras, é indicativo, segundo os técnicos, de que o dinheiro para o pagamento da Fazenda Jacaré de Chifre não saiu das contas da empresa Idalina Patrimonial. Foram apreendidos quatro originais de depósito e quatro cheques de um mesmo banco.

Em 13 de maio de 2011, Elza Cristina dos Santos emite cheque nominal para João Amorim no valor de R$ 4.990.000,00. No dia 16, ou seja, três dias depois, João Amorim emite cheque no mesmo valor para a filha Ana Paula Dolzan e esta, por sua vez, emite cheque para a Idalina Patrimonial e por fim a empresa lança cheque nominal ao vendedor da fazenda, no valor de R$ 4.989.708,26.

Para os técnicos, está claro que o dinheiro para a compra da fazenda veio de Elza Cristina dos Santos, que é sócia também na Ase Participações e da Kamerof Participações Ltda, esta última com sede na Holanda. Segundo a PF, no depoimento prestado no dia 9 de julho de 2015, durante a Operação Lama Asfáltica, ficou claro que Elza Cristina é laranja de João Amorim na Kamerof, empresa que tem faturamento anual de R$ 10 milhões. Foram apreendidos vários outros documentos que mostram o mesmo esquema para o pagamento das parcelas seguintes.

Na aquisição da Fazenda Santa Laura, localizada em Jaraguari, a estratégia foi um pouco diferente. Em março de 2010, Ana Paula Dolzan e outros pagam pela propriedade R$ 3 milhões, em 12 parcelas de R$ 250 mil. O rastreamento feito com base nos documentos apreendidos, levou ao indício de que o dinheiro saiu de conta bancária da Ase Participações. Segundo relato, foram encontrados três cheques com datas de 21 de maio de 2013, sendo uma no valor de R$ 350 mil de Elza Cristina dos Santos nominal a João Amorim, outro no valor de R$ 300 mil do dono da Proteco para a filha Ana Paula e, por fim, da Ana Paula para a Idalina Patrimonial. Em 22 de maio do mesmo ano, é feita transferência da conta da Idalina para a pessoa que vendeu a fazenda Santa Laura.

Também foram analisados documentos relativos a compra das fazendas Baia das Garças, em Bonito, e São Francisco, em Porto Murtinho. A compra foi feita pela Idalina Patrimonial, mas representada por João Amorim e sua mulher, Tereza Cristina Pedrossian Cortada Amorim. Negociação fechada em 24 de abril de 2013, pelo valor de R$ 20,5 milhões, pagos parceladamente até junho de 2015.

Verificou-se que a parcela paga em 28 de abril de 2015 teve como origem dinheiro que saiu da conta da Agropecuária Baia Participações. E a transação foi assinada por Tereza Cristina Cortada Amorim e Thadeu Silva Faria que, conforme documento apreendido, é genro de Edson Giroto. A Baia Patrimonial tem como sócios a Idalina Patrimonial e a mulher de João Amorim, e documento encontrado diz que Thadeu representa a Baia, junto com Tereza Cristina.

Na primeira fase da Lama Asfáltica foram identificados 11 fazendas que teriam sido compradas ou arrendadas por empresas e familiares de João Amorim, e outras cinco com suspeitas de também estarem sendo exploradas pelo grupo familiar do empresário.

Outros investigados - As investigações chegaram também ao ex-secretário estadual de Fazenda, André Cance e a ex-mulher dele, Ana Cristina Pereira da Silva. Segundo a PF, embora fosse apreendida a certidão de divórcio de ambos, verificou-se que continuam juntos, morando na mesma casa. Em dezembro de 2012, ela comprou a Fazenda Campo Limpo, em Corguinho. Valor da operação: R$ 1,5 milhão, mais de 60% abaixo do valor de mercado.

Foram encontrados também quatro declarações de operações imobiliárias em que Ana Cristina da Silva teria adquirido imóvel rural em Jaraguari. O valor de mercado dos imóveis chegou a R$ 1,9 milhão, mas foi informado que a compra foi feita por R$ 854 mil. Comprou também a Fazenda Santo Anastácio, em Aquidauana, e a Fazenda Nova Esperança, em Rio Verde. Ela não declarou no Imposto de Renda nenhum desses dois imóveis. No entendimento dos técnicos da Receita Federal, o objetivo é esconder a renda obtida com o esquema do qual André Cance era beneficiado.

As investigações apontam ainda que outros alvos da Lama Asfáltica adquiriram fazendas no Estado. O ex-secretário estadual de Obras, Edson Giroto, teria três fazendas em sociedade com o engenheiro e servidor público João Afeif Jorge e a médica Mariane Mariano de Oliveira. Há suspeita de que na verdade o sócio nos negócios seja o pai de Mariane, o servidor da Agesul (Agência Estadual de Gestão de Empreendimentos), Wilson Roberto Mariano de Oliveira, o Beto Mariano.

A fazenda Vista Alegre, no município de Rio Negro, foi adquirida em 2008 pela quantia de R$ 1.730.000,00. Localizada em Corumbá, a fazenda Maravilha foi comprada em 2013 por R$ 5,1 milhões. A fazenda Rio Negro, no município de Rio Verde de Mato Grosso, custou R$ 605.632,08 e foi comprada em 2013.