A ação judicial que investiga o escândalo envolvendo convênios da Prefeitura de Campo Grande com a Omep e a Seleta revelou indícios de como funcionava o verdadeiro cabide de acomodação eleitoral nas instituições. Políticos locais estariam usando desde 2005 a Seleta para contratar cabos eleitorais, amigos e parentes de aliados. A prática, antes apenas suspeita, está agora documentada até por ofícios de gabinetes de vereadores.

Somente este ano, ao menos 14 pessoas foram encaminhadas para contratação do órgão por três parlamentares, segundo informações da própria SAS (Secretaria Municipal de Assistência Social).

Entre os indicados, existe até mesmo uma mulher com experiência de costureira e vendedora indicada pelo gabinete do vereador Coringa (PSD) para uma vaga de professora. Mas a indicada possui apenas o ensino médio.

Líder das indicações deste ano, segundo os documentos apresentados pela Seleta a 2ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, o vereador Coringa assina os ofícios inclusive pleiteando as posições das pessoas encaminhadas.

Entre os 12 ofícios aos quais o Jornal Midiamax teve acesso, nenhuma das pessoas tem qualificação ou experiência para as vagas requeridas pelo gabinete. Entre elas, vagas para professores, recreadores “serviço social” (assistente social), cuidador, motorista e serviços gerais.

Uma das encaminhadas tem formação em Serviço Social e experiência em salão de beleza e é voluntária de uma igreja. Outro, que pleiteia uma vaga de cuidador, é acadêmico de Direito em uma universidade particular e não tem experiência na área.

Os vereadores Betinho (PRB) e Ayrton Araújo (PT) também pediram vagas para a Seleta por meio da SAS (Secretaria de Assistência Social). A prática é considerada normal e Coringa admitiu que faz o trâmite para quem vai ao seu gabinete pedir emprego.

“Mas eu encaminho menor aprendiz direto para a Seleta e os outros casos eu mando ofício para a Prefeitura”, afirmou. O parlamentar diz que a prática não é irregular e confirma que é uma situação recorrente. Betinho disse desconhecer os ofícios e afirmou que vai verificar a situação no seu gabinete, apesar de existir um ofício assinado pelo parlamentar. Ayrton Araújo afirmou que é "comum" receber pedidos de emprego e que apenas repassa os pedidos às secretarias da Prefeitura. Nos documentos, o ofício é assinado por Ayrton e encaminhado à Seleta. 

Como funciona

De acordo com relato ao juiz David de Oliveira Gomes Filho feito pelo presidente da Seleta , Gilbrás Marques da Silva, o contrato da entidade com a Prefeitura começou há 18 anos, na gestão de André Puccinelli (PMDB) e desde 2005 o objeto do convênio, feito para formar jovens e adultos para o mercado de trabalho, foi mudando.

A Prefeitura, na gestão de Nelson Trad Filho, começou a pedir contratação de pessoas para prestação de serviços e a demanda começou a crescer. Desde então, os vereadores daquela legislatura até o momento fazem os pedidos diretamente à Seleta para contratação de pessoa e encaminham “nome, o cargo e o salário da pessoa a ser contratada”. Gilbrás afirmou que a Seleta apenas assina a carteira de trabalho e “nunca mais vê o funcionário, salvo numa situação ou outra excepcional”.

Nos gabinetes, a situação é ainda mais grave. “Um vereador diz: - preciso de alguém para o meu gabinete. A pessoa vem com o ofício do Executivo, pré-designado, porque não é a Seleta quem escolhe e a contratação é feita e os salários são pagos. A Seleta fica com 5% do valor a título de ‘taxas de administração’”, revelou Gilbrás.

Outra investigação

Para o juiz David de Oliveira, a denúncia serve como objeto de nova investigação. “A ação da qual eu cuido vai fazer com que a Prefeitura cumpra ou não o TAC (Termo de Ajustamento de Conduta) pedido pelo Ministério Público. A denúncia feita de contratações de pessoas para gabinetes de vereadores, pagos fora do Legislativo, cabe em um novo procedimento de investigação do Ministério Público”.

David informou que se a Seleta não encaminhar os nomes dos vereadores que aderiram a prática, o pedido pode ser feito pelo Ministério Público. “É um pedido que cabe ao Ministério. Mas pelo que o funcionário disse, é uma prática recorrente e que muitos vereadores aderiram, principalmente nas gestões passadas. Só não posso afirmar que são todos porque preciso da documentação para afirmar isso, e os documentos estão na Seleta”.

A reportagem entrou em contato com Gilbrás da Silva e a informação na Seleta é de que ele estaria em reunião nesta manhã e que não poderia atender.