A crise financeira dos Correios começa a gerar efeitos sistêmicos e entra no radar de investidores, bancos e do governo.

Com prejuízo bilionário, Correios veem crise do plano de saúde acelerar urgência por crédito
Os Correios acumulam prejuízos desde 2022 e registram déficit de R$ 6,1 bilhões / Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado

 O plano de saúde da estatal, o Postal Saúde, enfrenta uma escalada de problemas operacionais, com relatos de cancelamento de consultas, descredenciamento de hospitais e clínicas e dificuldades para autorizações de exames e tratamentos, refletindo o agravamento do caixa da empresa.

A dívida dos Correios com o plano atingiu R$ 740 milhões em setembro, mais do que o dobro dos R$ 348 milhões registrados em dezembro de 2024. Segundo apuração do Estado de S. Paulo, o impacto direto da crise financeira da estatal tem comprometido a capacidade do Postal Saúde de manter pagamentos em dia à rede credenciada, pressionando o atendimento aos 193 mil beneficiários.

Dados da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) mostram que o Índice Geral de Reclamações (IGR) do plano saltou de 49,2 pontos em fevereiro para 111,45 pontos em julho, com leve recuo para 98,6 pontos em novembro. Para efeito de comparação, o índice médio do setor ficou em 48 pontos, e em 51,1 pontos entre planos de grande porte. O Postal Saúde figurou entre os cinco planos com mais reclamações nessa categoria.

Entidades representativas dos funcionários afirmam que há um problema generalizado no atendimento, decorrente da inadimplência da estatal. Relatos incluem suspensão de procedimentos de alta complexidade e dificuldades de continuidade em tratamentos oncológicos. O volume total de reclamações na ANS passou de 1,4 mil em 2023 para 1.648 em 2024, chegando a 1.887 entre janeiro e novembro de 2025, uma alta de 14,5%.

Procurados, os Correios afirmaram, em nota, que, na condição de mantenedores do Postal Saúde, atuam para garantir a continuidade do atendimento aos beneficiários. A Postal Saúde não se manifestou. A ANS informou que o plano está em situação regular de monitoramento, mas confirmou que mantém, desde junho de 2024, uma ação planejada de fiscalização, aplicada a operadoras com desempenho assistencial insatisfatório ou elevadas taxas de reclamação.

No centro da estratégia de sobrevivência financeira da estatal está a negociação de um empréstimo de R$ 12 bilhões, estruturado com cinco bancos e que depende de aval do Tesouro Nacional. A expectativa interna é de que os recursos sejam usados para regularizar dívidas, recompor o capital de giro e normalizar a operação do plano de saúde.

A operação envolve Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Bradesco, com R$ 3 bilhões cada, além de Itaú e Santander, com R$ 1,5 bilhão cada. Segundo pessoas a par das negociações, os juros devem ficar abaixo de 120% do CDI, dentro dos parâmetros exigidos pelo Tesouro para concessão de aval da União. A expectativa é de decisão ainda nesta semana.

De janeiro a setembro, os Correios acumularam prejuízo de R$ 6,05 bilhões. Paralelamente, a empresa negocia um acordo coletivo de trabalho no Tribunal Superior do Trabalho (TST) para evitar uma greve, em um momento em que a pressão regulatória, financeira e política se intensifica.

Para o mercado, a combinação de prejuízos bilionários, deterioração operacional e dependência de crédito com aval do governo reforça o debate sobre a sustentabilidade do modelo de negócios da estatal e o risco fiscal associado à sua reestruturação.

Pressão financeira e greve
Sindicatos de trabalhadores dos Correios aprovaram nesta terça-feira (16) uma greve geral por tempo indeterminado, com início às 22h, em estados que concentram grandes contingentes de funcionários, como Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Ceará e Paraíba.

Em São Paulo, a paralisação foi aprovada em assembleia mesmo sem o aval da direção sindical local, evidenciando o grau de insatisfação na base. Para o mercado, a combinação de prejuízo bilionário, pressão operacional, dependência de crédito com aval do Tesouro e agora o risco de interrupção dos serviços amplia a incerteza sobre a capacidade de execução da estatal no curto prazo e reforça o debate sobre o custo fiscal e político da sua reestruturação.