Veja possíveis efeitos das mudanças climáticas no Brasil
Furacão Catarina veio do mar em direção a Santa Catarina. / Foto: UFSC/Divulgação

Esta semana, representantes de 195 países reunidos em Paris, na COP 21, a conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas, estão numa rodada definitiva de negociações para um acordo que desacelere as emissões de gases do efeito estufa .

A discussão sobre o clima é global, mas os efeitos das mudanças climáticas são locais. O vasto território e as paisagens diversificadas fazem do Brasil um cenário que pode ser afetado das mais diversas formas por esse fenômeno, seja com o aumento de eventos extremos, como secas e furacões, com a alteração de paisagens naturais, como a Amazônia e o Pantanal, ou com prejuízos para a agricultura.

Veja abaixo alguns exemplos de como o aquecimento global pode afetar o Brasil:

Sul do Brasil

Meteorologistas ouvidos pelo G1 concordam que o furacão Catarina, que afetou o sul de Santa Catarina em 2004, é efeito de uma mudança climática. De magnitude F1, primeiro nível da escala internacional de furacões, ele foi o primeiro furacão registrado no Atlântico Sul. De acordo com o meteorologista Mário Quadro, professor do Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), com a elevação da temperatura na Terra, os modelos meteorológicos apontam que deve haver mais fenômenos extremos no estado.

Segundo ele, no entanto, não é possível afirmar quais fenômenos têm maior probabilidade de acontecer. "Não quer dizer que vai ter mais tornados, especificamente. Entretanto, eventos que são registrados praticamente anualmente, como enchentes, podem vir com mais força", explica.

"O Catarina foi um evento excepcional -- nunca tinha ocorrido, nem era previsto", explica o meteorologista Michel Nobre Imuza, coordenador no Brasil de um projeto internacional sobre mudanças climáticas chamado Vacea (Vulnerabilidade e Adaptação a Mudanças Climáticas Extremas nas Américas). Até 2016, os pesquisadores levantarão dados para sugerir ações governamentais, ambientais e sociais para que populções convivam com as mudanças climáticas.

Agricultura na Bahia

O aumento da temperatura também pode prejudicar a plantação do cacau no sul da Bahia, segundo Dário Ahnert, pesquisador e professor de genética e melhoramento de plantas da Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc). Ahnert desenvolve um estudo referente ao cacau e mantém pesquisas sobre o fruto. "O problema do aumento de temperatura não é o calor, mas sim a falta de chuva. Isso porque a plantação do cacau precisa de 40 litros de água diários por planta, e se não chove, a situação fica complicada", alerta o professor.

Amazônia
Seca no Rio Negro, em 2010, um dos principais afluentes do Rio Amazonas (Foto: Euzivaldo Queiroz/A Crítica/Reuters)
Seca no Rio Negro, em 2010, um dos principais afluentes do Rio Amazonas (Foto: Euzivaldo Queiroz/A Crítica/Reuters)

Na floresta amazônica, que ocupa praticamente metade do território nacional, o aquecimento global também deve ampliar a ocorrência de eventos climáticos extremos. Um estudo recente mostra que devem ocorrer mais secas no leste da região, e mais inundações no oeste. A pesquisa avaliou as projeções de 35 simulações de computador para o clima da Amazônia e mapeou os mais prováveis impactos da mudança climática para a região diante de um cenário relativamente pessimista, no qual a emissão de CO2 continua crescendo desenfreadamente.

“Os modelos sugerem que as áreas afetadas por secas meteorológicas moderadas e severas vão quase dobrar e triplicar, respectivamente, até 2100”, escrevem os pesquisadores no artigo. “Extremos de umidade também estão projetados para aumentar depois de 2040.”

Segundo Paulo Brando, a motivação para o estudo é que as projeções para o que vai acontecer com o clima médio na Amazônia já estão bem consolidadas, mas são os eventos extremos que mais impactam o ambiente e as pessoas na região. As secas recentes de 2005 e 2010, dizem os cientistas, são “análogas das condições projetadas para o futuro”. “O que estamos vendo nas projeções é mais seca, mais chuva e estações secas mais longa”, afirma Brando. “Falar em secas e períodos de extremo chuvoso é diferente de falar em mudança média no clima, à qual gente consegue se adaptar muito melhor. São os extremos que causam os grandes impactos.”

Pantanal
Rio Paraguai “é o tronco” do sistema do Pantanal, segundo o pesquisador da UFMS (Foto: Nicoli Dichoff/Embrapa Pantanal)
Rio Paraguai “é o tronco” do sistema do Pantanal, segundo o pesquisador da UFMS (Foto: Nicoli Dichoff/Embrapa Pantanal)

O Pantanal é outro bioma que pode ter consequências com o aquecimento global. “Podemos dizer com alguma confiança que o clima global está mudando, e as temperaturas estão se tornando mais quentes. A maioria dos modelos climáticos concordam com esse cenário. Isso pode ter consequências dramáticas para o ciclo da água do Pantanal, alterando o ciclo de inundação anual do rio Paraguai. Poderão ocorrer longos períodos de seca, o que influenciará negativamente a flora e a fauna”, comenta o professor do curso de geografia da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS) em Corumbá, Aguinaldo Silva.

O engenheiro florestal e coordenador do programa Cerrado-Pantanal da organização não-governamental WWF Brasil, Júlio César Sampaio, aponta que o bioma úmido pantaneiro depende fundamentalmente do ciclo hidrológico de cheia e seca para sua manutenção. Uma das principais ocorrências do processo de mudanças climáticas, o de períodos de estiagem mais longos e extremos, já é sentido em algumas regiões pantaneiras, afirma. “Em alguns municípios do Pantanal, a população já está percebendo que a seca está ficando mais longa e mais severa”, diz.

Ele considera que a persistência desse “evento extremo” do processo de mudança climática na região pode afetar “drasticamente” todo o ecossistema pantaneiro, influenciando no ciclo de inundações e empurrando várias espécies de peixes e animais para áreas cada vez menores, “estrangulando” o bioma.

A chefe-geral da Embrapa Pantanal, Emiko Resende, considera que é cedo para fazer previsões de consequências atribuídas às mudanças climáticas. "No período de 1975 a 2008, o rio Paraguai ultrapassou os 5 metros todos os anos, tendo havido cheias excepcionais que chegaram perto dos seis metros. A partir de 2008, as cheias voltaram a oscilar de ano para ano, entre cheias grandes e pequenas, como no período de 1900 a 1964. Dessa forma, ainda torna-se muito prematuro e difícil fazer qualquer previsão”, afirma.