Ocupada pelo agronegócio, região pode ser exemplo da união de economia e sustentabilidade.

Saiba tudo sobre o Pantanal e sua rica biodiversidade
Desde 2012, tuiuiú é considerado oficialmente como ave-símbolo. / Foto: Valdenir Rezende/Correio do Estado

Um santuário ecológico. Um incrível ecossistema, com mais variadas espécies da fauna e flora. A lista de denominações para definir o Pantanal de Mato Grosso do Sul é enorme, tamanha a riqueza de sua biodiversidade.

A maior planície inundável do planeta ocupa 89.826 quilômetros quadrados, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou 25% do território sul-mato-grossense. 

Toda essa área é povoada por 174 espécies de mamíferos, 580 de aves, 131 de répteis, 57 de anfíbios e 271 peixes. Apenas de plantas, segundo a Embrapa Pantanal, da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), são mais de 2 mil.  

O número parece expressivo, mas de acordo com o pesquisador Walfrido Moraes Tomas, da Embrapa Pantanal, o número depende muito da extensão do ecossistema.

“Por exemplo, a Mata Atlântica vai desde o nordeste até o sul do país, e essa área enorme contém ambientes com interface marinha, montanhas muito altas, e variedades de clima, e isso sim gera mais riqueza de espécies de fauna e flora”, exemplifica, e prossegue apontando as características da região pantaneira.  

“O Pantanal é relativo pequeno e praticamente plano, então não tem muita variedade climática e nem de relevo, o que limita o surgimento de espécies únicas”, disse.

Apesar disso, isso não significa que a região não tenha espécies únicas, conforme o pesquisador.

“Elas existem, especialmente plantas, como umas 4 ou 5 espécies de amendoim selvagem, por exemplo. Mas ainda existem outras espécies de distribuição restrita ao Pantanal, e o fato é que ainda desconhecemos muito sobre a biodiversidade na região”, destacou.

Em 2018, pesquisadores da Embrapa publicaram um estudo sobre a descoberta do Tupanvírus, um vírus gigante, mas que não causa doenças.

O primeiro Tupanvírus foi encontrado no sedimento de uma salina localizada em uma fazenda ao sul da região do Pantanal da Nhecolândia, em Corumbá.

CONCEITO

Existem discussões entre geógrafos, biólogos e autoridades quanto à classificação do Pantanal. Tanto o IBGE com o Ministério do Meio Ambiente (MMA) o consideram como um bioma, enquanto o consenso de geógrafos é de apontá-lo como faixa de transição.

No entanto, Tomas aponta que não há problema em considerar a região como bioma.

“Tecnicamente, o Pantanal é uma região contém ecossistemas que se encaixam em quatro dos 14 tipos básicos de biomas: Savanas, Áreas Úmidas de Água Doce, Florestas e Ambientes Aquáticos de Água Doce”, detalha o pesquisador.

“Como o Brasil adotou arbitrária e erroneamente o conceito de bioma, não há problema nenhum em considerar o Pantanal como ‘bioma’ válido nessa situação, já que isso serve apenas para dividir regiões mais ou menos diferentes em termos ecológicos”, explicou.

QUEIMADAS

Fenômeno recorrente, as queimadas se tornaram um problema que se arrasta há várias décadas. Devido à atividade agropecuária na região, parte dessas queimadas são causadas para manejo da vegetação e melhorar a qualidade para o gado.

Para minimizar os danos, o governo de Mato Grosso do Sul proibiu em 2014 a queimada controlada entre 1º de agosto e 31 de outubro na região pantaneira. 

Apesar disso, o fogo tem importância no cotidiano do ecossistema.

“Em qualquer savana o fogo é um elemento ecológico importante. Sua eliminação causa consequências para o funcionamento desses ecossistemas. No entanto, o uso exagerado do fogo para manejar a vegetação causa impactos negativos profundos”, alerta Tomas.

Ele cita uma sabedoria popular do Pantanal que a queimada deve ocorrer entre o fim do período das chuvas e antes da seca, para evitar a propagação das chamas.

“A outra forma de usar o fogo era queimar após as primeiras chuvas, no fim do ano. Essas queimadas, assim, ficam restritas a pequenas áreas, e não causam incêndios devastadores como vemos corriqueiramente no Pantanal”, lembra.

O pesquisador aponta que é possível conciliar economia e sustentabilidade no Pantanal.

“O Estado proíbe queimadas no período mais seco do ano, mas é exatamente nesse período que os grandes incêndios ocorrem. Então tem alguma coisa errada. Por outro lado, é possível conciliar o uso pecuário das savanas, como o Pantanal, e usar o fogo para manejar a vegetação”, explicou.

Tomas prossegue destacando um modelo que pode ajudar nesse sentido.

“Atualmente, defende-se a queima prescrita, que é aquela adotada em momentos corretos, com avaliação da vegetação e das condições climáticas, e servem para evitar acúmulo de material combustível e incêndios catastróficos. Essa abordagem talvez seja a mais correta, e impede que a mesma área seja queimada todos os anos, levando a uma degradação do solo e da qualidade da vegetação para o gado e para a biodiversidade”, afirmou.

PRESERVAÇÃO

E se fossem criadas mais reservas naturais para ajudar na preservação? O pesquisador lembra que o conceito de conservação inclui também a preservação em áreas protegidas, além do uso sustentável da terra.

“As reservas têm sua função, que é preservar amostras de ecossistemas em seu funcionamento o mais próximo do natural possível, sem interferência humana. No entanto, é preciso considerar que o maior desafio da conservação não está nas áreas protegidas, e sim nas áreas utilizadas por atividades humanas”, explicou.

Tomas lembra ainda que o Código Florestal prevê que áreas de proteção possam estar dentro de propriedades rurais.

“Isso tudo tem uma função muito clara, baseada na percepção de que os seres humanos são parte e dependem totalmente da natureza para existir. Não há meio termo nessa conclusão”, aponta.

“Por isso, a conservação e a sustentabilidade abarcam essas estratégias de proteger amostras relevantes dos ecossistemas,  em unidades de conservação públicas e privadas, além de regulamentar a proteção nas propriedades rurais através de Áreas de Proteção Permanente (APPs) e reservas legais”, complementa.
 

AMEAÇA À FAUNA

Mais do que vários ecossistemas, o Pantanal é uma região notória por abrigar grandes populações de espécies ameaçadas,  várias delas se recuperando nas últimas décadas.

“As onças tiveram suas populações drasticamente reduzidas em função da caça punitiva e para comércio de peles, mas houve uma recuperação”, lembra.

O pesquisador também cita outro exemplo: as ariranhas. “Foi o mesmo caso das ariranhas, que foram caçadas até sua quase extinção na região mas que hoje ocorrem em quase todos os rios e lagoas maiores do Pantanal”, completa.

Tomas sugere mais uma vez que a união entre a atividade pecuária e a preservação ocorra para evitar mais casos como já ocorreu anteriormente.

“Assim, a melhor forma de proteger essas espécies é adotar formas de produção que respeitem as condições capazes de garantir a sua persistência  no Pantanal, e isso passa pela conservação nas propriedades rurais, que somam mais de 90% da planície pantaneira”, defendeu.  

Para o pesquisador, criar estratégias para produtores rurais é uma alternativa, com políticas de incentivo para preservar suas propriedades.

“Essa é uma forma de recompensar esses proprietários pelo serviço que prestam à sociedade, protegendo não só a biodiversidade, mas também os diversos benefícios que o Pantanal presta ao planeta, ou seja, os serviços ecossistêmicos”, ressalta

Ícone pantaneiro, a onça-pintada já foi muito temida e perseguida, mais isso parece estar mudando.

“Todos os grandes predadores sempre foram temidos pelos seres humanos, e esse é um traço que vem de milhões de anos de evolução de nossa espécie. A situação de conflito se consolidou quando passamos a domesticar animais e a criá-los para consumo e geração de riqueza. Como esses grandes predadores muitas vezes predam esses animais domesticados, surgiu um conflito entre economia e convivência”, relembra.

“No Pantanal, como em muitos outros lugares, além da caça punitiva devido à predação do gado houve ainda a caça visando à venda de peles, encerrada no fim da década de 1960, quando a caça comercial foi proibida no Brasil. Esse processo quase dizimou a onça no Pantanal”, explicou.

Foi a natureza que ajudou a reverter essa situação, já na década de 1970.

“Em meados da década de 1970 o Pantanal iniciou um período de grandes cheias. Isso criou condições ecológicas para o aumento das populações de onças, beneficiado pela criminalização de seu abate, aumento da fiscalização e da conscientização por parte de muitos fazendeiros. O resultado foi um aumento gradual da população de onças, que voltaram a ocupar lugares onde essas haviam praticamente desaparecido”, explicou.

Com o crescimento da população de onças, turistas do mundo todo passaram a procurar o Pantanal para observar o felino.

“Atualmente, isso tem atraído turistas do mundo todo, porque o Pantanal é o lugar mais fácil de se observar onças em seu ambiente natural. Tem gerado divisas em função do turismo de observação em regiões como o Porto Jofre, em Poconé [Mato Grosso], além de Miranda e Pantanal do Rio Negro, no Mato Grosso do Sul”, relatou.

PERÍODOS

Entre janeiro e fevereiro, é possível aproveitar o período das cheias para contemplar a flora local em passeios de barco ou chalana. Em março e abril, o cenário ganha mamíferos e aves, e o clima já fica mais quente e chuvoso.

Já em maio, o Pantanal atinge a fase da vazante, ou seja, a transição da cheia para uma temporada de seca. Até junho, as aves colorem ainda mais os céus, principalmente o colheireiro.

A partir de agosto, começam a nascer filhotes nos ninhais e os ipês rosa e lilás dão o tom da planície. Até o mês seguinte, esse é o melhor período para pescaria, já que há menos chuvas.

Em outubro, os filhotes das aves começam a se arriscar fora dos ninhais. O clima fica ainda mais quente até dezembro, permitindo belíssimas vistas do pôr-do-sol.

ATRATIVOS

A pandemia de Covid-19 (doença causada pelo novo coronavírus) afetou diretamente o setor de turismo não só na região pantaneira, como em todo estado. Em abril, 34% das empresas do setor de hotelaria tiveram faturamento zero, segundo o Observatório do Turismo (ObservaturMS), da Fundação de Turismo do Estado (Fundtur-MS), e 8% delas tiveram de encerrar as atividades.

No fim de junho, a Fundtur lançou um plano de retomada do turismo local, após a flexibilização do setor pelos municípios.  

Um desses atrativos é a Fazenda San Francisco, em Miranda. Com desconto, o pacote de dois dias e uma noite custa R$ 392 por pessoas (apartamento quádruplo).

Também foi lançado o voucher quarentena, com validade até 23/12/2021. Os pacotes podem ser parcelados em até 3x sem juros via boleto bancário (crédito só será considerado após a confirmação de pagamento do boleto). Os pacotes dentro do voucher quarentena terão 20% de desconto.

Outra atração é a Estrada Parque Pantanal. Com 120 km, ela reúne trechos da MS-184 e da MS-228, localizados nos municípios de Miranda, Corumbá e Ladário. A viagem pode ser feita de carro de passeio, ônibus ou veículos de turismo. Porém, o ideal é fazer o percurso em veículos com tração para enfrentar os alagamentos do período de cheias.

Para acessar a estrada, o turista tem duas opções. Partindo de Campo Grande, via BR-262, deve acessar o Buraco das Piranhas, após passar por Anastácio, Aquidauana e Miranda, para chegar à MS-184. Saindo de Corumbá, acesse a MS-228.