Transportadores têm ampliado o foco em programas de gerenciamento de riscos para enfrentar o problema.

Em webinar com especialistas do mercado, aberto pelo coordenador de seu Comitê Security, Rafael Marson, a Associação Nacional para Difusão de Adubos (ANDA) alertou que o mercado brasileiro de fertilizantes convive com um problema grave e cada vez mais oneroso para o setor: entre janeiro de 2021 e dezembro de 2024, roubos, furtos e adulterações de produtos geraram prejuízo superior a R$ 40 milhões.

Quanto às adulterações, as perdas somaram R$ 26,9 milhões, enquanto os casos de roubos e furtos resultaram em R$ 21,7 milhões no período. Os dados mostram oscilação significativa ano a ano. Em 2022, o prejuízo total atingiu o pico da série, chegando a R$ 17,4 milhões. Em 2023, o valor caiu para R$ 10,9 milhões, mas voltou a crescer em 2024, que fechou com R$ 9,7 milhões em perdas acumuladas.

A adulteração de fertilizantes segue como o principal desafio. Entre 2021 e 2024, foram reportados 248 casos. Depois de uma queda de 43% entre 2021 e 2022, o problema voltou a crescer: os registros aumentaram 57% de 2023 para 2024.Segundo a ANDA, a maioria envolve produtos originados do Porto de Paranaguá, um dos principais corredores logísticos do setor.

Além da adulteração, o volume de roubos e furtos também pressiona a cadeia logística. De 2021 a 2024, foram registradas 222 ocorrências. Em 2024, houve alta expressiva: os casos dobraram em relação ao ano anterior, saltando de 29 para 58 registros.

A distribuição geográfica das ocorrências mostra forte concentração no Nordeste e no Norte. Maranhão, Pará, Mato Grosso e Paraná foram responsáveis por 91% de todos os roubos e furtos registrados em 2024. O Maranhão, sozinho, concentrou 70% dos casos, impulsionado por ações envolvendo cargas provenientes do Porto do Itaqui.

A combinação de prejuízos financeiros, riscos operacionais e impactos na segurança alimentar acende um sinal de alerta para toda a cadeia de produção e distribuição de fertilizantes no Brasil. Empresas do setor discutem medidas para reforçar a rastreabilidade dos produtos, aprimorar processos logísticos e ampliar a integração com órgãos de segurança pública.

Ações preventivas das transportadoras

Ana Paula Andriolli, da EuroChem, abordando a questão do seguro de cargas, salientou que profissionais do setor têm ampliado o foco em programas de gerenciamento de riscos como estratégia fundamental para diminuir perdas e aumentar a eficiência no transporte de cargas. Entre as principais frentes adotadas estão o monitoramento constante de rotas e o rastreamento dos veículos, além da análise detalhada do perfil de motoristas e transportadoras.

As tecnologias também têm assumido papel decisivo. Soluções de telemetria e dispositivos de Internet das Coisas (IoT) permitem acompanhar em tempo real o comportamento dos condutores, condições da carga e eventuais desvios de trajeto. Essas ferramentas se somam a programas de prevenção ao roubo e a acidentes, que vêm ganhando espaço nas operações logísticas.

Essas iniciativas, segundo Ana Paula, abrem um conjunto relevante de oportunidades para o setor. Ao aumentar a eficiência operacional, as transportadoras conseguem reduzir o número de sinistros e, consequentemente, conquistar um diferencial competitivo junto a clientes e seguradoras. Em muitos casos, a adoção de boas práticas permite inclusive a negociação de prêmios menores, já que o risco torna-se mais controlado.

Outro efeito direto, observou Ana Paula, é o fortalecimento da confiabilidade das transportadoras e embarcadores, que passam a operar com padrões mais elevados de segurança. O avanço tecnológico, por sua vez, estimula a inovação no setor logístico, criando um ciclo positivo de modernização.

Especialistas destacam que cada operação deve ser analisada individualmente, para que as medidas adotadas estejam sempre alinhadas às necessidades específicas de cada Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR).

Dependência do transporte rodoviário

Kleyton Bandeira, também da EuroChem, lembrou que o Brasil, terceiro maior produtor mundial de grãos, atrás apenas da China e dos Estados Unidos, avança em ritmo acelerado no consumo de fertilizantes. Nos últimos 20 anos, a demanda nacional disparou 450%, acompanhada por um crescimento de 80% das importações. Hoje, mais de 40 milhões de toneladas entram anualmente no mercado brasileiro, cifra que reforça a centralidade do insumo para manter a competitividade do campo.

Porém, esse avanço convive com um desafio estrutural: a dependência quase absoluta do transporte rodoviário. Dados setoriais mostram que, entre 2010 e 2024, 86% das cargas seguiram por estradas, enquanto apenas 14% utilizaram o modal ferroviário. A malha sobre trilhos, considerada pouco eficiente, força o escoamento por rodovias, muitas delas em condições precárias. 

Essa opção quase obrigatória tem um custo, alerta Bandeira. Entre 2010 e 2022, o transporte de fertilizantes ficou 21% mais caro. O aumento está diretamente relacionado à longa extensão das rotas, ao preço dos combustíveis e ao desgaste das vias. O resultado é um ambiente de maior risco logístico, com registros frequentes de acidentes e desvios de cargas.

Além dos entraves de infraestrutura, o setor enfrenta um problema crescente: a adulteração de fertilizantes. A prática, que se intensificou no país, compromete a qualidade dos produtos entregues aos produtores rurais e ameaça a credibilidade de toda a cadeia de suprimentos. Bandeira avalia que, em um mercado que sustenta boa parte da produção agrícola brasileira, os gargalos logísticos e os riscos associados ao transporte deixam claro que garantir eficiência e segurança no deslocamento dos insumos é tão estratégico quanto assegurar sua oferta.