Enquanto muitos vestem fantasias e maquiagens aterrorizantes, eles fazem o culto à natureza e a deuses antigos, além de agradecer a passagem das estações.

Para quem é bruxo de verdade, hoje é dia de comemorar e desvendar mitos:
Jovem conta que ajuda muitas pessoas com a religião dele. / Foto: Renan Ryan/Arquivo Pessoal

Para quem é bruxo ou bruxa de verdade, o 31 de outubro, quando se comemora o Halloween, é dia de comemorar e desvendar mitos. Enquanto muitos vestem fantasias, fazem maquiagens aterrorizantes e, em alguns casos, vão nas casas perguntando doces ou travessuras, eles fazem o culto à natureza e a deuses antigos, agradecendo a estação que está indo embora e atraindo boas energias para a que está por vir.

"Eu faço parte da Wicca, que é uma religião da bruxaria que faz o culto à natureza e aos deuses antigos, tendo um resgate a antigas práticas pagãs, que fazem o homem se religar com os antepassados. Hoje, aqui no hemisfério sul, temos uma comemoração em que celebramos o casamento sagrado entre o Deus e a Deusa, uma noite da fertilidade, do sol, na qual fazemos fogueira e dançamos ao redor para atrair prosperidade, sorte e também fazemos um agradecimento as estações", explicou ao G1 o bruxo Renan Ryan, de 29 anos.

No hemisfério norte, de acordo com Renan, a comemoração é diferente. "Lá é a comemoração do Samhain, que é a noite dos mortos. Para eles significa sem luz, então é o período que o véu entre o mundo dos mortos e o nosso se dissipa. No mais, a rotina de um bruxo é normal, apenas me considero um pouco mais espiritualizado, eu já agradeço a mãe terra desde a hora que eu acordo, por estar vivo e também quando me alimento", comentou.

Estudante de Letras, Renan ressalta que teve já muitos problemas com namoradas por conta da religião. "Não só com elas, mas, também tive problemas na faculdade. As pessoas acham que eu faço maldade, que sacrifico animais ou coisas do tipo. Na verdade, a palavra bruxaria tem uma carga pesada, só que o bruxo em si significa sabedoria e a gente tenta desvendar tudo isso. Seria estranho sacrificar animais até porque somos uma religião que cultua a natureza", explicou.

Ao relembrar o interesse pela religião, Renan conta que a avó frequentava tarólogos e ele a acompanhava. "Desde os 13 anos eu comecei a ter interesse. Aos 18, já estava lendo sobre bruxaria, magia e, desde então, eu sigo este caminho. Faço atendimento online de consultas de tarô e também faço banhos de cura e prosperidade. Eu também criei um canal na internet e estou com 60 mil seguidores.

Lá eu posto mais sobre a religião e também dou aulas", ressaltou.

Renan ressalta que os bruxos e bruxas se reúnem, com frequência, em Campo Grande. "Eu estou sempre trabalhando com essa arte e sei o quanto ajuda as pessoas, elas ficam felizes e melhores com as nossas consultas. Nós também fazemos piqueniques, geralmente com alguma palestra. Na lua-cheia, por exemplo, falamos sobre o autoconhecimento. Hoje, o que todo mundo mais precisa é se aceitar. Infelizmente, na bruxaria, muitas pessoas ficam escondidas e a gente até fala que elas vivem no armário de bruxas", brincou.

Já a professora Elizabete Bomfim, de 37 anos, saiu de Campo Grande há pouco mais de 4 anos. De lá para cá, ela já morou na Irlanda e, atualmente, está com a filha em Portugal. "É interessante porque aqui no hemisfério norte a estação é bem marcada, então a gente vê a morte, a morte da natureza: as folhas caírem, tudo fica cinza, o frio voltando, que é o que o dia 31 de outubro o Halloween representa, o culto ancestral, de quem já se foi. E não só lembrar os mortos, mas, lembrar que todos nós também vamos morrer. Quando a gente lembra, repensamos nossa vida, se estamos vivendo de maneira correta e aqui é a entrada do outono", explicou.

No Dia das Bruxas, em todo o mundo, é considerado um dia especial. "Em todo o mundo é considerado o dia da troca de estações, é um dia que os antigos já acreditavam que o véu entre o mundo espiritual e material está mais tênue, então faziam rituais para banir os espíritos malignos. Mas, acho que o mais importante do Halloween é lembrar da morte e isso nos faz viver", ressaltou.

Outra professora, de 46 anos, também segue a mesma religião há cerca de 2 anos. "A bruxaria é algo muito simples, se trata de uma conexão com a natureza. Você aprende o significado da lua, do sol. Eu tenho uma prima que é e, aos poucos, fui conhecendo e me interessando. Eu sei que assusta as pessoas, elas pensam em maldades, entidades e até por isso prefiro não me identificar. Antes, eu era espírita e agora vejo que o preconceito é muito maior. Mas, hoje teremos uma reunião para comemorar, é uma conexão com bruxas que estarão comemorando em todo o mundo", ressaltou.

O professor de História, Hugo Cezar Fernandes Gondim, de 26 anos, fala que conheceu o bruidísmo moderno há 12 anos. "É uma cultura baseada na história e mitologia das populações célticas, aonde hoje é a França. São povos que viveram ali na antiguidade do mundo europeu. Essas crenças continuaram a ser perpetuadas por pessoas que moravam no campo. Essas festividades dividimos em 8 principais durante o ano, falando da natureza, divindades e as estações do ano", comentou.

Conforme Gondim, os ritos religiosos estão sempre relacionados a estes temas. E, por ser algo bem desconhecido, ele fala de muita curiosidades das pessoas. "Eu explico um pouco, é uma religião politeísta, acredita em várias divindades, é diferente das religiões majoritárias, que são monoteístas. Já vi gente receosa em falar comigo, mas, no meu caso, é muito mais a questão da curiosidade. E eu gosto de falar, de desmistificar. São coisas muitas vezes relacionadas a falta de conhecimento", finalizou.