Jean Chera é o mais novo aposentado do mundo da bola. E hoje parece surreal dizer que o meia, que nesta segunda-feira botou tudo para vender e disse que vai morar com a namorada no Mato Grosso, um dia foi comparado a Neymar. Um dia pediu salário de Neymar. Um dia teve os seus feitos repercutidos da mesma maneira que Neymar na base. O destino dele, no entanto, não surpreende quem o acompanha há algum tempo com o mínimo de atenção, e uma pequena viagem no tempo se faz necessária para que essa afirmação seja melhor compreendida.

Em 2010, Chera tinha 15 anos de idade. E cinco de mídia. Fora descoberto por um vídeo em que mostrava muita habilidade com a bola. Logo choveram clubes interessados, e o pai, Celso, acertou com o Santos. Parecia o casamento perfeito, do mini-craque com o clube que mais revela jogadores para o futebol brasileiro. E a afirmação dele seria apenas uma questão de tempo.

A exposição midiática em torno do jogador o valorizou. Chera chegou ao Santos ganhando um salário alto. Se Neymar ganhava R$ 25 mil aos 13 anos, o meia canhoto já faturava um pouco mais: R$ 30 mil. Era visto com atenção, alvo de holofotes, recebia um tratamento nababesco fora das quatro linhas. Mas o campo, amigo, é um sujeito cruel, e trata de desmascarar quem não joga bola, e ali, aos 15 anos, os homens começam a se separar dos meninos.

Ali, aos 15, Neymar já atuava nos juniores. Tinha pouco mais de 40 quilos e já entrava fazendo gols contra jogadores até quatro anos mais velhos. Chera, mais desenvolvido fisicamente, era reserva da equipe sub-15 e o pai ainda queria um grande contrato com o próprio Santos. Há quem afirme no clube que ele chegou a pedir R$ 75 mil, por um jogador que sequer havia atuado profissionalmente. O Santos, com uma gestão diferente (Marcelo Teixeira, que levou Chera para o clube, havia dado lugar a Luís Álvaro de Oliveira Ribeiro, que não concordou com os valores). Era o fim da linha.

Dentro de campo, Jean Chera não encantava ninguém. A avaliação de muitas pessoas que trabalham na base brasileira é de que se tratava de um meia habilidoso, canhoto, bom nas bolas paradas, mas lento, sem dinâmica e com muitas dificuldades com a perna direita. Defeitos técnicos graves, que poderiam ser corrigidos, mas o deixavam em um nível abaixo dos principais jogadores da geração da qual ele fazia parte.

Após sair do Santos, o meia rodou por diversos clubes, sempre carregando uma cruz que não construíu, mas da qual se beneficiou. Milhares de garotos são dispensados todos os dias, e não recebem metade das chances de recomeço que ele recebeu. A persistência, diga-se, sempre foi uma de suas virtudes, e Jean Chera passou por Cruzeiro, Flamengo, Genoa, Cuiabá, Atlético-PR, tentou a sorte na Romênia. Sempre com passagens rápidas e sem sucesso. O excesso de exposição também incomodava funcionários dos clubes em que ele atuou. No Flamengo, ele marcou um gol em uma goleada por 11 a 0 dos juniores, e virou manchete, enquanto outro jogador, que fez cinco gols na mesma partida, foi apenas citado na mesma nota sobre o jogo.

Agora, após o aparente fim de uma carreira que mal começou, Jean Chera torna-se protagonista de uma narrativa comum, mas levada a extremos: a do fracasso no futebol profissional causado, em parte, por uma superexposição precoce, e em parte pela ânsia de faturar mais e mais antes de mostrar serviço. O outro lado da moeda em que Neymar, também em evidência desde cedo, estampa a cara como exceção que confirma a regra.