Motorista tenta negociar pontos de multa gravíssima pela internet
Rede social foi usada para comercializar pontos na CNH em Sorocaba. / Foto: Reprodução/Facebook

Um motorista usou uma rede social para tentar negociar a transferência de pontos da Carteira Nacional de Habilitação em Sorocaba (SP). Várias pessoas responderam a publicação com ofertas de preços, "leiloando" os pontos disponíveis para assumirem a multa. Horas depois, a postagem foi apagada.

A proposta foi feita em um grupo fechado onde moradores de Sorocaba e região vendem e alugam produtos novos e usados, veículos e até imóveis.

Na postagem, ele dizia ter sido multado com sete pontos na carteira e questionava se alguém poderia assumir a pontuação. Este tipo de penalidade é dado para infrações consideradas gravíssimas. Estão nesta lista, por exemplo, excesso de velocidade, avançar o sinal vermelho do semáforo ou trafegar pela contramão.
Segundo o vice-presidente da OAB de Sorocaba, tanto quem compra como quem vende os pontos na carteira de habilitação pode acabar sendo responsabilizado pelo crime de falsidade ideológica.

Em seguida, vários usuários começam a negociação, questionando valores e qual o tipo de habilitação seria necessária (A, para motos, ou B, para carros). Um usuário se oferece para receber os pontos em troca de R$ 300.

Outra usuária pede para que a negociação seja realizada "via inbox”, o sistema de mensagens privadas da rede social. A mensagem ficou disponível na página por mais de 13 horas antes de ser deletada.

A prática de se transferir multas é comum, porém a falsa informação sobre os dados do condutor que vai “receber” os pontos é considerada crime. “Quando se assume em um documento oficial uma declaração falsa, porque a pessoa não estava dirigindo, este é um crime tipificado como falsidade ideológica”, afirma o vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Sorocaba, Fábio Haddad.

Segundo o advogado, tanto quem compra, quanto quem vende os pontos na carteira pode acabar sendo responsabilizado. As penas, nestes casos, podem chegar a cinco anos de prisão e o pagamento de multas. “A partir do momento em que a pessoa vende os pontos que deveriam ser aplicados na própria CNH e isto fica comprovado, ela também pode ser responsabilizada porque também participa do crime de falsidade ideológica.”

Lei

A legislação federal de trânsito só permite que o dono do veículo indique outro motorista para receber os pontos quando a infração não foi cometida por ele.

No rodapé da notificação de autuação, há um campo para preenchimento e assinatura do dono do veículo e do infrator. Para validar a indicação do condutor, é preciso enviar cópia da habilitação de quem cometeu a infração ao órgão que aplicou a multa.

Não é errado, por exemplo, quando um pai empresta o carro ao filho e ele comete uma infração. Quando a notificação da autuação chegar, neste caso o pai deverá indicar o filho para receber os pontos.

Mas, mesmo neste caso, é preciso ter cuidado. “É comum, principalmente entre familiares, acabar passando a multa para um alguém que usa menos o carro, mas mesmo assim ainda é crime. De certa forma você está alterando a verdade e assinando uma coisa que não é verdade”.

A maioria das pessoas recorre a essa medida para evitar uma suspensão da CNH. O documento é suspenso quando o motorista atinge um número igual ou superior a 20 pontos de infrações no período de um ano. Após isto, o condutor é notificado por carta sobre a instauração do processo de suspensão e possui um prazo de 30 dias para apresentar uma defesa.

Denúncias

De acordo com o Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de São Paulo, casos como o mostrado na reportagem devem ser denunciados e encaminhados para a Polícia Civil. “Com as imagens das postagens será possível, por exemplo, identificar as pessoas e tomar as providências cabíveis”, diz a nota.

A orientação do departamento é para que nenhum cidadão aceite receber a pontuação de uma infração que não foi cometida por ele. O Detran não divulgou a quantidade de casos identificados de falsidade ideológica identificados pelo departamento, mas afirmou que quando existe a suspeita, o caso é investigado pela Polícia Civil e os envolvidos poderão responder na Justiça. Denúncias podem ser realizadas por meio do Disque Denúncia (181) ou da Ouvidoria do Detran.