Erros nas datas de protocolo e 'rapidez' levantam dúvidas sobre MPE-M

Inocentado no TJ, empresário suspeita de
Uma certidão comprova que os autos foram registrados no dia 18 de junho pela chefe do departamento, o PP n. 53/2014-MP. O ato é feito após a instauração do PIC (Procedimento Investigatório Criminal). / Foto: Midiamax

Um empresário exposto e denunciado pelo MPE-MS (Ministério Público Estadual de Mato Grosso do Sul) como autor de extorsão contra o Consórcio CG Solurb conseguiu provar a inocência na justiça e suspeita que o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado) tenha participado de suposta trama cinematográfica para 'proteger' um grupo empresarial.

Com denúncias de irregularidade na escolha de quem assumiria por 20 anos a coleta de lixo em Campo Grande a partir de 2012, Thiago Verrone se tornou um problema para a contratação bilionária do Consórcio CG Solurb. Mesmo assim, o grupo acabou vencendo a licitação no fim da gestão de Nelsinho Trad (PTB).

As denúncias de Verrone, no entanto, foram feitas ao MPE-MS, ao Ministério Público Federal e à Polícia Federal, que apontou o consórcio CG Solurb como suspeito de integrar suposta organização criminosa investigada na operação Lama Asfáltica.

Só que, ao invés de ver a investigação do que denunciou no Ministério Público Estadual de MS, o empresário foi surpreendido por uma 'operação' do Gaeco, que o acusou de extorsão.

Agora, inocentado por unanimidade em segunda instância no TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), Verrone apresenta indícios de que os membros do MPE-MS implicados no caso teriam agido com parcialidade, em defesa de interesses do grupo empresarial.

Ele diz que a 'rapidez' do Gaeco em agir para supostamente incriminá-lo foi oposta à 'inércia' para investigar as denúncias que fez contra a CG Solurb. Além disso, documentos apontam que diligências teriam sido organizadas a toque de caixa, até mesmo antes do registro oficial da queixa dos empresários contra ele.

Na Justiça, as várias desconexões documentais, falta de provas e erros em datas oficiais colocaram em xeque a denúncia do Gaeco contra o empresário, assinada pelo então coordenador do grupo, o promotor Marcos Alex Vera de Oliveira.

Segundo a defesa de Thiago, nos autos não há nenhuma outra prova, apesar de as investigações começarem antes mesmo do registro oficial da denúncia, como corroborado pela Justiça, a não ser o depoimento do grupo empresarial. "Apesar de desconexas, as declarações sequer foram contestadas nos autos pelo Gaeco por 'falta de equipamento de qualidade', conforme justificado pelo órgão na ação".

‘Premonição de extorsão’

A denúncia do escritório de advocacia do consórcio é assinada no dia 12 de junho de 2014. Mesma data em que foi recebida por Paulo Cezar dos Passos, atual chefe do órgão. Na época, ele era chefe de gabinete do então procurador-geral de Justiça Humberto de Matos Brittes.

No mesmo dia, segundo os protocolos oficiais do MPE-MS, Passos remete os autos ao Gaeco. No dia 17, Marcos Alex encaminhou cópia da portaria instaurando o Procedimento Investigatório Criminal n. 11/2014 à Procuradoria-Geral. Entretanto, o documento do escritório de advocacia só é protocolado oficialmente no órgão no dia 18 de junho, às 14h23, ou seja, um dia depois da denúncia já instaurada.

Tanto que, para instaurar o PIC 11/2014, Marcos Alex usa o número do procedimento 53/2014, que contém a denúncia do consórcio, para embasar seu pedido. "Mas como, se oficialmente toda a denúncia foi protocolada no órgão somente no dia 18 de junho?", questionou a defesa de Verrone. Acionado, nem o CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) soube explicar.

Já às 8h do dia 18, havia pedido de diligência, que foi cumprida, para gravar e flagrar um encontro do empresário da Solurb com Thiago Verrone. Mas o encontro aconteceu às 7h30, ou seja, antes mesmo do pedido oficial para flagrá-lo. As discrepâncias de datas e a 'celeridade' chamaram a atenção durante o julgamento da denúncia no TJMS.

Valor declarado antes de ‘cobrado’

Outro fato que chocou a Justiça ainda em primeira instância foi fato de passar despercebido pela investigação que o valor que teria sido pedido pelo empresário foi ‘previsto’ pelo denunciante. Isso porque o consórcio acusou Verrone de pedir R$ 5 milhões em documento encaminhado no dia 12. Mas, nos autos, o empresário do consórcio afirma que o pedido foi feito no encontro gravado pelo Gaeco no dia 18.

Na ação, também não constam as gravações de áudio comprovando o pedido, sob alegação de que o som ambiente teria atrapalhado a captação das vozes. Para tentar sanar a ‘premonição’, o empresário da Solurb afirmou que teria um ‘print’ do pedido de R$ 5 milhões feito via WhatsApp, jamais apresentado à Justiça como prova.

O juiz Roberto Ferreira Filho, que absolveu Thiago Verrone em primeira instância, cita ainda que a única referência efetiva a negociações foram conversas entre o empresário e um antigo sócio.

“Dos trechos supracitados (e do restante dos diálogos de igual forma) não está claro – ou seja, a dúvida permanece – de quem partiu o interesse na “negociação”. Isso porque o empresário teria direito a receber, conforme esclareceu nos autos, valores por descumprimento contratual com um antigo sócio, que à época teria se associado a CG Solurb.

CNMP

Percebendo a incongruência dos atos, a defesa do empresário instaurou reclamação junto ao CNMP em 2015 para reclamar que no mesmo dia que recebeu a denúncia oficial, o então PGJ Humberto Brittes despachou pela procedência, “o que mostra no mínimo um grande interesse no feito que seria ingressado, uma vez que absolutamente nada dentro de tal órgão funciona com tamanha celeridade”, alfineta o questionamento.

A instauração do PIC por Marcos Alex, segundo a defesa, “em um ato ainda mais célere que do procurador-geral, que fez tudo no mesmo dia” causou estranheza por ter sido realizado com um dia de antecedência.

A defesa tratou o caso junto ao Conselho Nacional como ‘provas incontestáveis de atitudes imorais e repletas de vícios e irregularidades’, frisando que o empresário vinha apresentando denúncias ao MPE desde 2012 contra o consórcio e que nada seria feito a respeito no Ministério Público.

Entretanto, segundo Verrone destaca, as mesmas denúncias apresentadas à Polícia Federal e ao MPF (Ministério Público Federal) resultaram em medidas como a Operação Lama Asfáltica e em uma ação civil pública, mostrando que, para ele, o MPE ‘não demonstra a mesma agilidade em apurar a verdade dos fatos’.

O CNMP contesta as acusações, afirmando que estava apenas pendente o registro do protocolo, uma ‘mera formalidade’ e a um ‘pequeno desencontro de datas’. E ainda corrobora que as ações foram tomadas antes do registro oficial da denúncia junto ao protocolo do órgão.

Medidas contra o MPE-MS

O empresário Thiago Verrone, absolvido em primeira e segunda instâncias, afirmou ao Jornal Midiamax que os advogados que trabalham para ele estudam que medidas tomar em relação à situação. “Foi um processo que durou três anos. Tenho uma empresa de consultoria técnica e eles conseguiram o objetivo deles, que era tirar minha credibilidade junto ao mercado, tentando me forçar a retirar todas as denúncias que tenho contra eles na Justiça. Não dei um passo atrás”, diz.

Além de possíveis medidas de reparação de danos contra o consórcio, a defesa estuda como acionar o MPE-MS na Justiça. “A atuação foi visível para me prejudicar e em favor do grupo empresarial. Não vamos representar ao CNMP, pois tentamos durante o processo e eles nada fizeram. Estudamos ainda as possíveis medidas”, ponderou.

A reportagem entrou em contato devidamente documentado com o MPE-MS, o promotor Marcos Alex e com a ASMMP (Associação Sul-mato-grossense de Membros do Ministério Público Estadual) para comentarem as denúncias do empresário, mas não obteve ainda os posicionamentos, que aguarda.

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