“É meu direito saber de onde vim”, diz mulher ao descobrir por DNA que foi trocada em maternidade de MS há 43 anos

“É meu direito saber de onde vim”, diz mulher ao descobrir por DNA que foi trocada em maternidade de MS há 43 anos
Cleonice que encontrar os pais biológicos após descobrir que foi trocada em maternidade de MS. / Foto: Cleonice Bonin/Arquivo Pessoal

Criada por uma família de Mato Grosso do Sul, Cleonice Bonin de Oliveira, hoje com 43 anos, descobriu há seis anos que foi trocada ao nascer em uma maternidade de Dourados, a 228 km de Campo Grande. A dúvida começou após realizar um exame de DNA por sempre ouvir que não se parecia com as duas irmãs.

"Desde pequena eu sempre ouvi que não parecia com a minha família e foi por isso que decidi fazer o exame. É meu direito saber de onde vim", desabafa.
Atualmente vivendo na cidade de Santa Bárbara do Oeste, em São Paulo, o maior sonho de Cleonice é conhecer os pais biológicos: "Quero saber como eles são e como estão. De seis anos para cá eu penso neles todos dias", chora.

A mulher conta que ao saber do resultado do exame, solicitou um segundo DNA para tirar toda a prova, mas confirmou o que não queria ouvir: "Imagina só, da noite para o dia todas as pessoas que você conviveu por 37 anos da sua vida não tem o seu sangue e não é nada seu", lamenta.

Cleonice conta que em razão da descoberta teve depressão e que isso acabou afetando a gestação que tinha na época, o que levou a perda do bebê. Por outro lado, diz que a situação acabou fortalecendo o elo familiar com o casal que a criou.

Para ajudar na investigação da família, o hospital forneceu ainda em junho deste ano uma lista com os nomes das mulheres que haviam feito parto normal no mesmo dia que ela. Os registros das cesarianas, entretanto, a instituição alegou que não possuía mais.

Com essas poucas informações e com a ajuda de amigos, ela descobriu por meio de redes sociais que uma das crianças que havia nascido de parto normal no mesmo dia dela morava em Campinas, em São Paulo. Ela localizou a mulher, explicou a história e foi feito um exame de DNA, com material do pai. O teste deu negativo e a aflição da família toda só aumentou.

Ela conta que há cerca de três meses, o hospital após ser acionado na Justiça, pagou uma indenização a ela pela troca, reconhecendo seu erro. “Essa indenização não vai trazer minha vida de volta”, lamenta.

Nascida no dia 9 de janeiro de 1976, de parto natural, no Hospital Evangélico de Dourados, a família da mulher nunca suspeitou que tivesse ocorrido uma troca de crianças na maternidade da instituição, mas a diferença em sua aparência física em relação as duas irmãs mais velhas, de 49 e 47 anos, sempre a incomodou.

A investigadora Maria Campos, do setor de desaparecidos da 5ª Delegacia de Polícia, ressaltou que já está no caso e que essa semana viaja até Dourados para buscar informações sobre a troca das crianças. Maria Campos ainda informou que o hospital têm contribuído com documentos que irão ajudar na localização da mãe biológica de Cleonice: "Já fizemos alguns levantamentos e automaticamente achando a mãe dela, vamos achar a filha da Nilza e iremos resolver os dois problemas de uma vez só. É questão de dias, a gente vai conseguir", finaliza.

Hospital nega troca, mas é condenado pela Justiça

Em nota encaminhada ao G1, o hospital Evangélico aponta que foi surpreendido em 2013 por uma ação indenizatória movida pelos pais de Cleonice e por ela própria, que alegavam no processo que tinha ocorrido uma troca de bebês no dia do nascimento da mulher, em 9 de janeiro de 1976.

O hospital ressalta que não mediu esforços para esclarecer a situação, mas que documentos da época já haviam sido incinerados e que mesmo assim, com o que avaliou como sendo uma carência de provas, foi condenado pela Justiça e fez um acordo com a família para pagar um valor a título de compensação por danos morais.

Confira a íntegra da nota do hospital:

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Em 2013 a Associação Beneficente Douradense – Hospital Evangélico Dr. E Sra. Goldsby King foi surpreendida com o recebimento da ação indenizatória em que Nilza Motta Bonin, José Gomes de Oliveira Filho e Cleonice Bonin de Oliveira, visavam o recebimento de compensação por danos morais, ao argumento de que houve troca de bebês na Maternidade mantida pela ABD-HE, fato que teria ocorrido na data de dia 09 de janeiro de 1976.

Apesar dos esforços empreendidos pelo Hospital na realização de buscas em seus arquivos tentando elucidar os fatos alegados, tais tentativas restaram infrutíferas, uma vez que aconteceram há mais de 37 anos, afirmando que os documentos foram incinerados possivelmente em 1996, por força da prescrição vintenária prevista no artigo 177, do Código Civil de 1916, vigente à época.

Todavia, ainda que carente de provas da ocorrência do fato alegado, entendeu o douto Juízo da Comarca de Dourados, em aplicar a responsabilidade objetiva da Administração Pública, por força da qual é adotada como regra a teoria do risco administrativo, muito embora o Hospital Evangélico, como pessoa jurídica de direito privado, atuou no caso, por meio de convênio com o Poder Público, para atendimento de pacientes do SUS.

Em consequência, a ABD-HE celebrou acordo com as partes litigantes, honrando os valores ajustados a título de compensação por danos morais.