Primeiros moradores vieram na década de 1920, de Minas Gerais, depois da Abolição

Na área quilombola Chácara Buriti, cada morador é um pouco de terra. Da doutora, brota tese sobre o uso de plantas medicinais. Do agricultor, as verduras que garantem sustento. Da menina, de cenho franzido até um relutante sorriso iluminar o rosto, brota a esperança no futuro.
A força da terra emana da área localizada a 18 quilômetros de Campo Grande, no sentido ao distrito de Anhanduí, onde estridentes araras voam baixo e o verde das hortas colore a paisagem.
Formada em Biologia, Sthefany Caroline Bezerra da Cruz Silva, 27 anos, foi morar na Comunidade Negra Rural Quilombola Chácara do Buriti após o casamento e usou na tese de doutorado os saberes locais sobre a biodiversidade.
“A gente conseguiu identificar 80 plantas que eles utilizam aqui. Aqueles entrevistados mais novos tinham menos conhecimentos, você percebe que a fonte e sempre os mais velhos”, afirma Sthefany, doutora em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional pela Uniderp e professora na rede estadual de ensino.
No estudo, foram utilizados dois índices: valor de uso e importância relativa. “O valor de uso é quanto mais uma planta é citada e a importância relativa é a quantidade de sistemas do corpo que ela trata. As plantas com índices maiores foram arruda, carqueja e jatobá”, diz a pesquisadora.
As plantas não chegaram a ser testadas, mas se destina, a sintomas como dor de cabeça, febre e problemas respiratórios. “Já tem vários registros em outros trabalhos, produzidos no Brasil e fora, que apontam uma atividade semelhante ao que usam como medicinal”, afirma Sthefany.
Com atendimento médico em Campo Grande ou Anhanduí, as plantas servem como atenção primária aos adoentados. “Já foi levantado em vários trabalhos de comunidade tradicionais que o uso das plantas além de lembrar todo o passado deles, que tinha bastante contato com a natureza, também é uma forma de fazer atenção primária”, salienta.
O milagre do chão – Com atuais 50 casas, uma igreja, um centro de informática com acesso à internet e um orelhão recém-chegado, a comunidade quilombola já viveu do gado, olaria, trabalho em fazendas vizinhas até se firmar na agricultura familiar, cuja produção se destina à merenda escolar.
Junto com a alface, rúcula, salsa cebolinha crescem as expectativas de que a terra ancestral seja fonte de renda para os moradores. Estudante de agronomia, Robert Domingos da Silva, 20 anos, trocou o trabalho em Campo Grande pelo cultivo de folhagens na horta da família.
“Sempre pensei que teria que trabalhar em outras coisas. Nunca pensei que conseguiria alguma coisa aqui. Que sobreviveria daqui”, diz. Nascido por lá, hoje ele concilia o trabalho no quilombo com a faculdade em Campo Grande. Há espaço para novos planos, como a produção de maracujá orgânico.
Enquanto a vida muda, o preconceito segue enraizado. “Existe, vai existir e não vai acabar. Com estudo, trabalho posso ter uma condição financeira melhor. Mas vou ser aceito pelo que tenho, não pelo que sou”, diz o jovem. Ele conta que é olhado “diferente” se entra, por exemplo, numa loja de grife. Tratamento que se altera se estiver ao lado de um amigo branco.
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