Arquitetos sul-mato-grossenses conheceram Kongjian Yu, uma das vítimas da queda do avião em Aquidauana, e o aguardavam em Campo Grande, nesta quarta-feira.

Criador do ‘cidades-esponja’, arquiteto Kongjian Yu buscava no Pantanal novas soluções para enchentes
Arquitetos sul-mato-grossenses conheceram Kongjian Yu, uma das vítimas da queda do avião em Aquidauana, e o aguardavam em Campo Grande, nesta quarta-feira. / Foto: Kongjian Yurquiteto ressaltou que a água é “a chave para o ecossistema humano urbano”. (Redes sociais)

Conhecido mundialmente pela criação arquitetônica “cidades-esponja”, conceito que explora a relação com o meio ambiente, o arquiteto Kongjian Yu desbravava o Pantanal sul-mato-grossense em busca de novas soluções para o impacto das enchentes. O bioma — a maior planície alagada do mundo — seria material de estudo do documentário com o cineasta Luiz Fernando Feres da Cunha Ferraz. Os dois morreram em uma queda de avião nesta terça-feira (23), na região da fazenda Barra Mansa. O piloto e o fotógrafo Rubens Crispim Júnior também morreram na queda.

Carlos Lucas Mali, conselheiro federal que representa o Estado e do CAU (Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Mato Grosso do Sul), além de ser coordenador da comissão de assuntos internacionais do CAU, encontrou Kongjian Yu recentemente e o aguardava, nesta quarta-feira (24), para debater os conceitos arquitetônicos possíveis no Pantanal.

“Nosso contato começou quando ele esteve em Brasília, na Conferência Estacional, entre 4 e 6 de setembro. Tivemos um contato bastante grande e, na semana seguinte, no dia 18, ele fez uma palestra na Bienal de São Paulo. Conversamos bastante, inclusive, conheci o cinegrafista que iria viajar com ele para fazer essa matéria sobre cidades-esponja. Essa era a ideia dele: criar ao longo das cidades alguns locais que pudessem absorver água. É como se fosse um córrego, por exemplo, que, na hora que enchesse, tivesse mais espaço para não ir para a via. A gente ia ter contato com ele depois para ver o resultado e conversar sobre o Pantanal. Trocamos, inclusive, telefones”, descreve.

A inovação através do Pantanal
Mali diz ainda que a proposta do arquiteto era trabalhar pelo mundo, inclusive em Mato Grosso do Sul, aplicar e estudar o conceito “cidades-esponja”.

“Ele é o arquiteto mais bem conceituado nesse assunto. Nós temos algumas cidades que já têm feito isso no Brasil, como em Curitiba, mas não nessa dimensão. Nós iríamos conversar sobre o Pantanal quando ele voltasse, mas isso não vai existir. A conversa sobre o Pantanal seria na volta. Na ida, o cinegrafista disse que eles iam lá fazer essas imagens e que ele ia fazer todo um estudo, conhecer o que acontece no Pantanal, as inundações, tipo de solo. Não conversamos muito sobre o Pantanal porque ele não conhecia.”

Carlos Lucas Mali encontrou Kongjian Yu no início do mês (Arquivo pessoal)
Kongjian Yu seria recepcionado no plenário do conselho, em Campo Grande, no previsto retorno, como menciona Mali. Além disso, a categoria preparava trabalhos arquitetônicos para pedir a avaliação do especialista.

“Eu fiquei muito triste. Para nós, de MS, principalmente, foi muito triste. Ele estava fazendo um trabalho por nós no Pantanal, estudando as cidades-esponja, que é o trabalho dele. Nós estávamos iniciando um trabalho com o arquiteto, e esse material se perdeu.”

Abalo na categoria
Criadora de casas para ribeirinhos no Pantanal sul-mato-grossense, a arquiteta Bianca Tupikin também iria recepcioná-lo no retorno para entregar a catalogação sobre as construções ecológicas no bioma. Ela chegou a ter um encontro na conferência internacional de Brasília, no dia 18 de setembro.

“Tive uma breve conversa e falei do meu trabalho no Pantanal. Ele era muito requisitado, sempre havia muita gente ao redor dele. Um dos motivos pelos quais fui à Brasília participar da conferência foi por ele ser um dos palestrantes.”

“Nesse contato, ele disse que se sentia feliz em saber que deixaria um legado. Que muitos abraçaram o conceito de cidades-esponja e que desejava que esse conceito pudesse ser replicado cada vez mais. E que saber que podia contribuir para um mundo melhor era uma sensação de paz. Ele disse que a semente foi plantada e que os novos poderiam continuar o trabalho. Mas que ainda tem muito a fazer.”

‘Partiu no cenário que traduzia a perfeição’
“Morreu enquanto buscava no Pantanal a imagem maior do seu próprio sonho. O arquiteto das ‘cidades-esponja’ partiu no cenário que traduzia com perfeição a sua ideia: a terra que absorve, guarda e devolve a água, em equilíbrio com a vida. É uma perda imensa para o mundo, mas também uma coincidência que ressoa como símbolo. Ele deixou a vida no lugar que melhor expressa a natureza da sua obra, como se o Pantanal tivesse acolhido não apenas o visitante, mas também o criador de uma visão que permanecerá”, encerra Tupikin.