A expectativa é que até o fim do ano o texto com as orientações para o parto domiciliar esteja pronto.

Com aumento de parto domiciliar, audiência discute protocolo para Capital
Audiência mobilizou mulheres, médicos ginecologistas e obstetras, enfermeiros, representantes de hospitais e doulas que lotaram a Câmara Municipal. / Foto: Fernanda Palheta

Mesmo sem estatística dos riscos de complicações e de mortalidade neonatal e materna em partos domiciliares no Brasil, a escolha por ter filhos em ambientes não hospitalares é crescente no país. A onda pela busca do parto em casa chegou em Campo Grande e mobilizou mulheres, médicos ginecologistas e obstetras, enfermeiros, representantes de hospitais e doulas que lotaram a audiência pública na Câmara Municipal, na manhã desta quarta-feira (6), sobre os riscos e benefícios deste tipo de parto.

Segundo dados da Sesau (Secretaria Municipal de Saúde Pública), em 2018, dos 16.446 nascidos em Campo Grande, 51 nasceram em casa. Este foi o caso da filha da assistente social Jéssica Echeverria, de 30 anos, que nasceu no dia 1° de junho do ano passado, em um parto domiciliar.
Um ano e cinco meses depois, Jéssica relata para ter o parto em casa teve um plano e conta que foi acompanhada e assistida durante todo o processo. “Foi super tranquilo. Meu esposo estava comigo o tempo todo, nós chegamos a escutar música, como se fosse um dia comum. Ela veio no tempo dela”, lembrou.

A assistente social ainda conta que no início da gravidez sentiu a pressão para fazer uma cesariana. “Minha primeira médica queria que eu fizesse uma cesária, mas eu não queria aquilo nem para mim e nem para a minha bebê. Não sentia a necessidade de fazer uma cirurgia. Mas até o preço cobrado induz para esse tipo de procedimento. Um parto natural era R$ 10 mil, já a cessaria era R$ 6 mil”, detalhou.

Já a arte educadora e cientista social, Larissa Lopes, de 28 anos conta que a decisão do parto domiciliar veio depois de sofre violência obstétrica durante o parto do primeiro filho, em 2016. “Eu amarrada, fui colocada na posição vertical, eu tive meu períneo dilacerado e sofri violência verbal e o meu pós-parto foi muito difícil, tive depressão pós-parto e tive dificuldade para amamentar e com o meu segundo filho não tem nem comparação, ele nasceu em casa, nunca tivemos problema nenhum de saúde, nunca tive problema com alimentação, no primeiro momento de vida ele já mamou. Para mim não tem igual”, compara.

Para a presidente da Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia de Mato Grosso do Sul, a a médica ginecologista e obstetra Vanessa Chaves, a onda por partos domiciliares está relacionada a casos como o da Larissa. “Nosso entendimento é que as mulheres não se sentem fortalecidas no ambiente hospitalar, estamos em uma luta para melhorar isso, para que elas se sintam protagonista dentro do hospital, mas se ela optar por um parto domiciliar eu preciso que ela saiba dos riscos que ela está correndo”, aponta.

Conforme a médica ginecologista e obstetra, o parto domiciliar traz mais riscos para a mãe e o bebê. “Sabemos que nascimento em ambiente não hospitalar as chances de complicações maternas, mas principalmente neonatais é muito maior”, afirmou. Entre os riscos estão mais chances de morte neonatal e complicações neurológicas do bebem além do risco de complicação materna.

Ela ainda reforça que a Federação Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia não é favorável a partos domiciliares. “Isso é uma demanda da sociedade, mas se a mulher escolhe esse tipo de parto as políticas de saúde têm que proporcionar condições como o transporte eficiente dessa mulher para um hospital, caso necessário”, disse.

Protocolo - Após a audiência o presidente da Comissão de Saúde, vereador Lívio () adiantou que será criado um grupo de trabalho para construir um protocolo de inclusão e exclusão destes partos em Campo Grande. A expectativa é que até o fim do ano o texto com as orientações para o parto domiciliar esteja pronto para balizar o procedimento a partir do ano que vem.

A diretora técnica da Maternidade Cândido Mariano, Cláudia Emília Lang, destacou a importância de desenvolver um protocolo na Capital. “Hoje nós só ficamos sabendo que foi tentado um parto domiciliar na hora da complicação, quando o Samu [Serviço de Atendimento Móvel de Urgência] traz e já é uma tragédia. Mas gente acha que muitos partos ocorreram e deu tudo certo”, afirmou.

Com um protocolo, os hospitais assumem um papel de retaguarda. “A ideia é que os hospitais sejam avisados para que, em um caso de complicação, essa paciente consiga ser trazida o mais rápido possível e que a gente saiba. Porque complicações acontecem no hospital e podem acontecer em casa também”, completou.

O chefe do setor materno infantil do HU (Hospital Universitário), o médico ginecologista e obstetra, Ricardo dos Santos apontou que hoje os partos domiciliares são feitos indiscriminadamente em Campo Grande e alerta para os riscos. “Esse tipo de parto sempre vai ter riscos maiores. Com esse protocolo podemos minimizar esses riscos”, afirmou.