Coletar quase 2 toneladas de papelão para ver Ana Castela custou caro para a família de aluna de 8 anos

‘Ana Castela elogiou’, diz prefeito sobre desafio escolar denunciado por trabalho escravo em MS
Coletar quase 2 toneladas de papelão para ver Ana Castela custou caro para a família de aluna de 8 anos / Foto: Anny com a mãe, catando papelão, e o sonhado encontro com Ana Castela. (Fotos: Arquivo Pessoal)

Responsável por criar um desafio escolar que virou alvo de denúncia ao MPT-MS, Maycol Queiróz, prefeito da cidade de Paranaíba, em Mato Grosso do Sul, pronunciou-se após o município virar réu de processo por trabalho escravo e infantil. Segundo ele, até a cantora Ana Castela elogiou a ação da prefeitura.

No final de junho deste ano, Maycol lançou a gincana envolvendo todas as escolas municipais de Paranaíba: o aluno que arrecadasse a maior quantidade de papelão seria premiado com uma pulseira para o camarim de Ana Castela, que faria um show em 3 de julho, nas comemorações do aniversário da cidade.

O problema é que a aluna Anny Gabrielly, com ajuda da família e de amigos, impressionou todos ao conseguir coletar 1,7 toneladas do material reciclável, realizando o sonho de entrar no camarim da artista.

Agora, após denúncia ao MPT-MS, o município, a escola e a mãe da garotinha de 8 anos precisam prestar esclarecimentos pela acusação de trabalho infantil e escravo, motivada pela atividade de coleta de papelão proposta pela competição do prefeito.

“Ela não recolheu material. Quem organizou a campanha foi a mãe, com apoio dos familiares e do comércio local. Foi uma campanha educativa em todas as escolas. A cantora Ana Castela elogiou o nosso trabalho e ficou uma hora no camarim com a família da Anny Gabrielly”, declarou Maycol Queiróz ao Jornal Midiamax.


Denúncia anônima tem tirado o sono da mãe de aluna
O processo tramita em segredo de Justiça, mas Ana Paula Alves da Silva, mãe de Anny, não entende por que só o caso de sua filha foi denunciado como trabalho escravo.

“Isso [trabalho escravo] não aconteceu. Eu tive uma equipe, minha família toda ajudou. Ah, não, mas denunciaram, me mostraram o papel lá e disseram que não era pra eu falar pra ninguém, que vai vir intimação”, lamenta Ana Paula.

Anônima, a denúncia ao Ministério Público do Trabalho de Mato Grosso do Sul tem tirado o sono da dona de casa.

“Não vão me calar, estou sendo muito caluniada. Agora vou ter que responder até processo por um concurso que a prefeitura lançou? E a menina que ficou em segundo lugar com mais 1 tonelada de papelão? E outra, em terceiro, com 900 kg? Por que só a minha filha foi denunciada, nenhuma outra criança? Tô quieta desde o mês passado, estou a ponto de explodir”, desabafa.

MPT diz que situação está prevista na lei
Por meio de nota, o MPT-MS detalhou que o procedimento instaurado em face do município vai acompanhamento o cumprimento das normas vigentes no que tange à proibição do trabalho infantil e proteção do trabalho do adolescente.

“Considerando as limitações de um procedimento promocional, que tem como finalidade a promoção de políticas públicas – como inspeção dos órgãos que compõem o Sistema de Proteção Social, a capacitação do município, entre outras frentes – instaurou-se também uma notícia de fato (…) que foi convertida, no dia 21 de julho, em inquérito civil”, traz trecho da nota.

O MPT-MS pontuou, ainda, que “em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o inquérito civil tramita sob sigilo, o que inviabiliza a divulgação e detalhamento de informações sobre o seu andamento”. A entidade também destacou a Convenção nº 182 da Organização Internacional Trabalho (OIT), que aprova a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), traz a “coleta, seleção e beneficiamento de lixo” como uma das piores formas de trabalho infantil, que colocam em risco a vida e saúde de crianças e adolescentes, com graves repercussões físicas e psicossociais.