A classe lembra de suas especificidades e com isso rejeita seu enquadramento no regime geral.

A diferença entre militares e civis

A reforma da previdência social, pregada pela comunidade econômica como essencial  à recolocação do país nos eixos, gera discussões. Além das idades mínimas para aposentadoria, tempo de contribuição, tetos salariais e diferenças entre servidor público e privado, há a questão dos militares. A classe lembra de suas especificidades e com isso rejeita seu enquadramento no regime geral.

Estudos revelam que enquanto o trabalhador das empresas se aposenta após contribuição por 30 anos (mulher) e 35 (homem), o militar, por não ter o mesmo direito do civil a horas extras, adicionais noturnos, de feriados e fins de semana, mesmo indo para a inatividade aos 30, trabalha o equivalente a 45 anos se considerada a jornada de 8 horas diárias. Cada militar excede, em média, quatro horas diárias a sua jornada de trabalho em cercos, prisões em flagrante e outras atividades de segurança. Militar também não tem Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e, depois de inativo, continua recolhendo para aposentadorias e pensões, tendo seu período médio de contribuição calculado em 62 anos. Isso sem falar que os regulamentos o impedem de exercer outra atividade e de rejeitar trabalho perigoso.

Os militares envolvidos na discussão admitem a reforma previdenciária. Mas defendem critérios próprios, decorrentes das especificidades da profissão e de sua utilidade pública na segurança nacional. Quem não tem os mesmos direitos trabalhistas do setor privado, não pode ter sua seguridade a ele comparada, defendem. E se for mudar, é preciso instituir os direitos, coisa que o cofre público dificilmente conseguiria suportar.

O foco mais aparente das discussões está entre os militares do Exército, Marinha e Aeronáutica, as três forças federais compostas por 300 mil homens e mulheres. Mas é necessário considerar a existência das instituições militares estaduais (polícias e bombeiros), cujos regimes de disciplina, hierarquia, obrigações e direitos são semelhantes aos das Forças Armadas. Com uma diferença: enquanto as três armas federais, em tempos de paz, como os que vivemos, precisam estar sempre preparadas e à disposição para eventuais ações ou até para a guerra, os militares estaduais vivem na permanente guerra urbana da segurança pública. Seus soldados de todas as patentes têm a missão de policiamento ostensivo e preventivo e diuturnamente confrontam com a marginalidade. Matam, morrem, sofrem, são incompreendidos e, mesmo assim, cumprem o dever social e profissional.

Os responsáveis pela reforma previdenciária jamais deverão descolar o militar estadual do sistema que vier a ser gestado para o federal. Isso seria um duro golpe e traria sérias consequências para a nossa já sofrida e insuficiente segurança pública. As coisas são como são devido à lógica do setor e, principalmente, as condições do cofre público que não teria recursos suficientes para dar ao militar o mesmo tratamento que a CLT e legislações complementares garantem ao trabalhador do setor privado.

Tenente Dirceu Cardoso Gonçalves é dirigente da ASPOMIL (Associação de Assist. Social dos Policiais Militares de São Paulo) 

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