
Faça o teste: pergunte a qualquer pessoa leiga quem ela conhece no taekwondo. A resposta - caso haja - não fugirá de Diogo Silva e Natália Falavigna. A dupla foi a cara da modalidade nas últimas três Olimpíadas. O primeiro chegou a duas semifinais e conquistou o ouro no Pan-Americano, em 2007, no Rio. A compatriota era a detentora da única medalha olímpica do esporte até o último sábado. Ambos estão fora de atividade, o que deixou uma lacuna - a falta de um símbolo que sintetizasse a modalidade. Nos Jogos do Rio, porém, surgiu um candidato com credenciais para isso: Maicon Andrade, medalhista de bronze na categoria acima de 80kg e novo xodó da arte marcial.
Do anonimato à fama, Maicon Andrade terá quatro anos pela frente para se consolidar como referência no que faz, pelo menos, no Brasil. O atleta, que ocupava a 51ª posição do ranking oficial, é tratado como um grande talento e o terceiro lugar na Rio 2016 potencializa a condição. A torcida é para que ele sirva de espelho para os talentos que poderão ir a Tóquio em 2020, atue como escudo para eles, suportando todo o tipo de pressão e ainda evolua para alcançar suas próprias metas, afinal, terá 27 anos na próxima edição dos Jogos.
Feliz pelo bronze de Maicon, Diogo Silva, que acredita que a medalha seja uma homenagem a todos os brasileiros que tentaram fazer o que apenas Maicon Andrade conseguiu e espera que o tempo seja o melhor conselheiro do compatriota. O ex-lutador espera ver como o mineiro vai se portar nesta nova etapa, regada de elogios, novas oportunidades pessoais e profissionais. Embora fique longe de ser um astro do futebol, terá de administrar a fama repentina.
- Vamos ver como essa medalha vai repercutir para o Maicon. Foi tão rápido. Levamos anos para chegar perto do que ele já conseguiu. Ele passava na rua e muita gente não o conhecia, agora, a vida dele vai muda. É um medalhista olímpico e será cobrado por medalha em 2020, o que é extremamente difícil de se lidar. Temos que ver como ele vai reagir. Sucesso e fama tiram as pessoas do equilíbrio, passei isso no Pan, sei o que uma medalha pode trazer de positivo e negativo - declara Diogo, em entrevista ao GloboEsporte.com.
Acostumado a ser flecha, Maicon terá um alvo às costas na próxima competição que disputar. Essa é só uma das dificuldades que encontrará no caminho. Diogo, no entanto, é otimista e, pelo que conhece do lutador, acha que ele conseguirá lidar com o cenário que se avizinha, pela simplicidade e discrição mostradas desde o início de sua trajetória.
- Ele é um cara pé no chão, simples, que gosta de treinar. Não é ganancioso e nem vaidoso. Treina em uma equipe séria (2 Brothers), na qual os técnicos vão cobrá-lo para que ele fique melhor ainda. Era um anônimo, agora está todo mundo postando que ele é o cara. Virou pessoa pública. Muitas portas se abrem, algumas que você nem sabia que poderiam se abrir. Vai ganhar um dinheiro que jamais pensou em ganhar, qualquer pessoa pode ser influenciada por isso. É difícil gerir. Todo mundo estará observando o jogo dele. Tenho quase 100% de certeza que os dez melhores do mundo não estudaram o Maicon para esta Olimpíada. Agora, ele será a preocupação de todos os oponentes.
Responsável pela primeira medalha da história do taekwondo brasileiro, Natália Falavigna tem discurso que vai ao encontro do defendido por Diogo. A paranaense - integrante do grupo técnico da Confederação Brasileira de Taekwondo (CBTKD) - também não tem pressa em colocar Maicon Andrade como líder da nova geração.
- Ele vai assumir se ele entender que é o responsável e tiver perfil. Isso não deve ser colocado antes para não gerar pressão. Ele conquistou um bom resultado e vai conquistar outros desde que queira, treine e esteja motivado para isso. Colocar braçadeira em alguém é precipitado. Há vários líderes e acho que ele vai ser um deles na próxima geração. É passo a passo. Ele tem que se manter fiel aos seus princípios e ideias. É preciso entender que no esporte as coisas acontecem muito rápido. Você não é campeão, você está campeão. Se fosse dar um conselho, seria esse: manter a cabeça no lugar, pois ele sabe que o campeão se constrói no dia a dia. Quando você se torna espelho, referência, tem que tomar cuidado com as palavras e atitudes. O Maicon é um bom garoto, um cara simples, bacana de se conviver. É inteligente, um atleta com muitos recursos, talentos e bom coração. Chegar ao topo é mais fácil do que se manter. Terá que treinar cada vez mais, inovar, se antecipar às possíveis armadilhas dos rivais.
Natália pontua que o feito de Maicon é uma segunda chance ao taekwondo, para que praticantes, professores e a sociedade vejam o potencial do esporte. A visibilidade que a medalha traz também estimula a curiosidade de novos interessados em artes marciais - e ela sonha com novas conquistas nas próximas Olimpíadas.
- A influência da minha medalha está demonstrada agora: a do Maicon vai ser demonstrada nas próximas que vierem, e assim por diante. A medalha do Maicon tem que ser comemorada. Quando há grandes conquistas, o número de praticantes sobe, os investimentos aumentam, a engrenagem gira. É bom para a modalidade que alguém esteja aparecendo, em evidência na mídia, mostra o poder de resultados. Espero que os investimentos aumentem para que o bronze vire prata e ouro. É um processo contínuo.
Companheira de Maicon Andrade na seleção e na Rio 2016, Julia Vasconcelos, também competidora na Rio 2016, acredita que a história de superação do amigo - que trabalhou como garçom e pedreiro - poderá ajudar a estimular outros praticantes e a cativar tantos outros.
- O Maicon tem uma história de vida peculiar. Foi garçom, pedreiro, muita gente vai se espelhar nele ao conhecer a sua história. Ele se transformar em líder do taekwondo vai depender do que propagar com o passar do tempo e das suas escolhas, mas espero que isso aconteça, pois ele é um cara gente boa, bacana.
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