No Rio Grande do Norte, diferença chega a oito vezes. Crime é a principal causa de morte entre brasileiros e brasileiras dos 15 aos 29 anos.

Jovem negra tem 2 vezes mais chance de ser assassinada no Brasil
Manifestantes em São Paulo, na Segunda Marcha Internacional pelo Fim do Extermínio do Povo Negro. / Foto: Foto Públicas/Oswaldo Corneti

Em todos os estados do país e no Distrito Federal, com exceção do Paraná, as jovens negras têm 2,19 vezes mais chances de serem vítimas de homicídio do que as jovens brancas.

No Rio Grande do Norte, diferença chega a oito vezes. Crime é a principal causa de morte entre brasileiros e brasileiras dos 15 aos 29 anos.

Dados foram divulgados no Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência 2017, lançado na segunda-feira (11) pela UNESCO e pela Secretaria Nacional de Juventude. Pela primeira vez, relatório abordou diferenças de gênero nas taxas de assassinato de jovens.

No Brasil, uma mulher jovem e negra tem mais que o dobro de chance de ser vítima de homicídio quando comparada a uma jovem branca.

É o que revela o Índice de Vulnerabilidade Juvenil à Violência (IVJ) 2017, divulgado pela UNESCO e pela Secretaria Nacional de Juventude na segunda-feira (11), em Brasília, para marcar o Dia dos Direitos Humanos, lembrado anualmente em 10 de dezembro.

Levantamento aponta que assassinatos são a maior causa de morte entre brasileiros e brasileiras de 15 a 29 anos.

Em todos os estados do país e no Distrito Federal, a mulher negra nessa faixa etária está mais vulnerável a esse tipo de crime do que a população branca do sexo feminino.

A exceção à regra é o Paraná, onde a taxa de homicídios entre jovens mulheres afrodescendentes é menor do que a verificada entre as brancas. A comparação baseada em gênero é inédita na história do IVJ.

De acordo com o relatório, jovens negras têm, na média nacional, 2,19 vezes mais probabilidade de serem assassinadas do que as jovens brancas.

No topo da desigualdade racial e de gênero entre as taxas de homicídio, está o estado do Rio Grande do Norte, onde as jovens negras têm 8,11 vezes mais chances de serem mortas em relação às jovens brancas, seguido do Amazonas (6,97) e da Paraíba (5,65).

No Maranhão (1,1) e em Tocantins (1,15), as variações do risco de uma jovem negra e de uma branca sofrer homicídio são as menores registradas no estudo.

Quando a informação sobre o sexo da vítima é subtraída da análise, 24 unidades federativas registram índices de homicídio maiores para a juventude negra — que tem 2,7 vezes mais chances de ser morta dessa forma do que os jovens brancos.

No Paraná, há a mesma inversão identificada anteriormente — brancos estão em situação mais vulnerável. Em Tocantins, os riscos vividos por brancos e negros são bastante próximos.

Em Roraima, não foi possível realizar o cálculo, pois o estado não registrou morte de nenhum jovem branco no período avaliado.

Os dados de homicídios foram obtidos no Sistema de Informações de Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, tendo 2015 por ano-base.

As estatísticas mostram que estados das regiões Norte e Nordeste apresentam taxas de vitimização bastante superiores à média nacional, com a desigualdade entre jovens negros e brancos se acentuando nessas porções do território brasileiro.

A maior discrepância no índice de mortalidade por homicídio foi verificada no Nordeste: enquanto a taxa de jovens brancos vítimas de homicídio foi de 27,1 por 100 mil, a de jovens negros foi de 115,7 por 100 mil, ou seja, quatro vezes superior.

Para o cálculo de todos os valores estaduais e regionais, foram utilizadas estatísticas de 304 municípios com mais de 100 mil habitantes.

Presente no lançamento, o secretário nacional de Juventude, Francisco de Assis Costa Filho, afirmou que o IVJ servirá para nortear políticas públicas, tanto sobre juventude, quanto para a redução de homicídios, considerando quem são as principais vítimas, onde vivem, qual seu nível de renda e inserção no mercado de trabalho, bem como seu grau de escolaridade.

"Jovens representam 27% da população brasileira. Jamais tivemos e jamais teremos tantos jovens no país. Esses dados mostram uma clara desigualdade na forma com que a violência atinge a juventude negra.

Esta mesma violência cresceu e parecia contraditório estar com o principal plano de redução de homicídios, o Juventude Viva, desativado", acrescentou o gestor, que lembrou o relançamento da iniciativa em parceria com a UNESCO.

Em agosto de 2017, o projeto Juventude Viva foi retomado com a agência da ONU e, segundo Assis Filho, começará a implementar ações em fevereiro de 2018.

Para a representante interina da UNESCO no Brasil, Marlova Jovchelovitch Noleto, "a violência no Brasil, apesar de nossos esforços, não tem cedido".

"Essa violência tem raça, escolaridade, indicadores socioeconômicos, indicadores de territorialidade e tem gênero, como conseguimos mostrar pela primeira vez.

Não é possível que continuemos a assistir a essas mortes de forma impassível sem que focalizemos ações", cobrou.

A dirigente acrescentou que o problema diz respeito a todos os níveis de governo. Para solucioná-lo, será necessário o engajamento de diferentes setores, com políticas de educação, saúde, empregabilidade e estímulo ao empreendedorismo para os jovens. "A nossa juventude não é o futuro e sim, o presente. Ela exige ações agora", completou.

O lançamento do relatório acontece no âmbito da campanha Vidas Negras, pelo fim da violência contra a juventude afrodescendente do Brasil.

Associada à Década Internacional de Afrodescendentes (2015 – 2024), a iniciativa foi anunciada pelas Nações Unidas em novembro (7) e visa sensibilizar a população sobre o peso do racismo no quadro de violência e letalidade no país.

"São 23 mil jovens negros assassinados por ano. Essa é uma realidade que requer que todos somemos esforços para transformar.

Neste sentido, lançamos recentemente a campanha Vidas Negras, que convida a todos os brasileiros e brasileiras a agir contra a discriminação que também motiva essas mortes", explicou no evento o coordenador-residente do Sistema ONU no Brasil, Niky Fabiancic.

Alagoas e Amapá encabeçam ranking de homicídio e desigualdade racial
A análise do IVJ 2017 apresenta dois indicadores distintos: o de risco relativo, que é a razão entre a taxa de mortalidade por homicídio de jovens negros e brancos; e o IVJ – Desigualdade Racial, que varia de zero (nenhuma vulnerabilidade) a um (máxima vulnerabilidade) e mensura a suscetibilidade da população de 15 a 29 anos à violência, levando em conta aspectos intersetoriais.

Alagoas é o estado com os maiores risco relativo — no estado, são assassinados quase 13 vezes mais negros do que brancos — e índice de vulnerabilidade (0,489).

O segundo maior risco relativo do Brasil foi identificado no Amapá, com um valor de 11,94. Em terceiro, está a Paraíba (8,87) e, em quarto, o Rio Grande do Norte (6,9).

Quando avaliados os índices de vulnerabilidade, Alagoas vem seguido pelo Ceará (0,487) e pelo Pará (0,471).

Santa Catarina (0,209), São Paulo (0,209) e Rio Grande do Sul (0,216) têm os menores indicadores.

O Distrito Federal (0,225), quarto estado com menor vulnerabilidade, ocupa uma posição particular no ranking, pois o risco relativo de homicídio entre jovens negros e brancos foi estimado em 3,37. Isto quer dizer que, mesmo que a violência seja baixa, ela afeta a juventude seletivamente.

Vulnerabilidade nos municípios
O IVJ 2017 traz pela primeira vez o recorte de vulnerabilidade à violência na faixa de 15 a 29 anos, que foi a idade definida para jovem, em 2013, pelo Estatuto da Juventude.

Até a edição de 2014, elaborada com dados de 2012, o relatório era elaborado para a faixa etária dos 12 aos 29.

Além de apresentar as variações a nível estadual das taxas de homicídio entre negros e brancos, homens e mulheres, a pesquisa divulga o IVJ Violência nos Municípios, com indicadores de mortalidade por assassinato e por acidentes de trânsito nas cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes. A avaliação traz estatísticas também sobre frequência escolar, emprego, pobreza e desigualdade.

Segundo o relatório, embora o homicídio seja a principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos no Brasil, menos de 20% dos 19 milhões de jovens. vivendo atualmente nos 304 municípios avaliados. moram em cidades de vulnerabilidade juvenil alta e muito alta.

O IVJ classificou 21 municípios na categoria vulnerabilidade muito alta, sendo Cabo de Santo Agostinho, em Pernambuco, a cidade onde a juventude se encontrava mais vulnerável à violência, seguido por Altamira, no Pará, e São José de Ribamar, no Maranhão.

O município em melhor situação está localizado em São Paulo: São Caetano do Sul tem baixa taxa de mortalidade por assassinato e por acidentes de trânsito e bons indicadores de frequência à escola e situação de emprego.