A votação do projeto de lei antifacção, aprovado por ampla maioria na Câmara (370 a 110), expôs novamente a divisão da bancada federal de Mato Grosso do Sul.
A proposta, enviada pelo governo Lula, ganhou contornos políticos após o presidente da Câmara, Hugo Motta, escolher como relator o deputado licenciado e secretário de Segurança de São Paulo, Guilherme Derrite, aliado de Tarcísio de Freitas provável adversário de Lula em 2026.
Em MS, o placar ficou mais equilibrado.
Votaram a favor do texto de Derrite os deputados
Marcos Pollon (PL),
Rodolfo Nogueira (PL),
Luiz Ovando (PP) e
Beto Pereira (PSDB).
Contra, posicionaram-se
Camila Jara (PT),
Vander Loubet (PT),
Dagoberto Nogueira (PSDB) e
Geraldo Resende (PSDB).
O relatório de Derrite, que passou por seis versões em duas semanas, endurece penas para crimes ligados a facções, mas flexibiliza regras sobre bloqueio e perdimento de bens, ponto criticado pelo governo. Mesmo após ajustes atendendo a reivindicações do Planalto, petistas tentaram adiar a votação, sem sucesso. O texto segue agora para o Senado.
A escolha de Derrite como relator e sua recusa inicial ao diálogo ampliaram o desgaste político. O governo acusou falta de negociação, enquanto o relator afirmou não ter sido procurado. Paralelamente, governadores como Ronaldo Caiado e Cláudio Castro pressionaram pela equiparação de facções ao terrorismo, hipótese descartada por Motta.
Ao longo das revisões, Derrite recuou em pontos sensíveis, como a restrição ao perdimento de bens e limitações à Receita Federal, após críticas de auditores e delegados. Também reforçou definições de organização criminosa ultraviolenta e criou o crime de domínio social estruturado, com penas que podem chegar a 40 anos.
Com as alterações, o destino dos bens apreendidos passou a ser o Fundo Nacional de Segurança Pública. O texto também permite audiências de custódia por videoconferência e aumenta penalidades para crimes cometidos por facções, milícias e grupos paramilitares.
Câmara aprova texto-base do projeto de lei antifacção
Por 370 a 110 votos, a Câmara dos Deputados aprovou nesta terça-feira (18) o texto-base projeto de lei de combate ao crime organizado (PL 5582/2025). Os deputados acataram o texto apresentado pelo relator, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), que alterou trechos da proposta original encaminhada pelo governo federal. O relator apresentou cinco versões.
O projeto prevê penas mais duras para integrantes de facções criminosas e apreensão de bens de investigados.
Derrite defendeu que “o enfrentamento do crime organizado no Brasil exige legislação de guerra em tempo de paz”. Os parlamentares governistas, contrários ao parecer de Derrite, dizem que o projeto Antifacção foi desconfigurado e descapitaliza a Polícia Federal.
Deputados analisam agora os destaques, que podem mudar trechos do texto-base. O projeto segue depois para o Senado.
“Vamos retomar texto original no Senado”
“Nós vamos lutar para retomar esse texto original. Vamos modificar no Senado para recuperar o propósito original do governo de combate à facção criminosa”, disse o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ).
O parlamentar destacou que o projeto foi elaborado depois de mais de seis meses de estudo.
A deputada Jandira Feghali (PCdoB -RJ) argumenta que o texto de Derrite acaba protegendo as organizações criminosas.
“O relatório inova com uma ação civil pública que acaba protelando o confisco de bens do crime organizado”, criticou. Para ela, prejudica a investigação da Polícia Federal ao descapitalizar a corporação. No parecer, relator encaminhou “o quinhão cabível à PF ao Fundo Nacional de Segurança Pública”.
Outra crítica do governo federal é que o parecer de Derrite só permitia ao Estado assumir o patrimônio do crime após o término da ação penal, o que poderia levar anos.
O deputado Kim Kataguiri (União Brasil – SP) concordou com o texto do relator de que a ação é necessária para recuperar os bens a serem apreendidos pela PF. “A gente ainda escuta discurso aqui de que nós estamos defendendo corruptos de colarinho branco, de que nós estamos defendendo o banqueiro”, criticou.
O texto aprovado prevê a apreensão prévia de bens do investigado em certas circunstâncias, com a possibilidade de perdimento dos bens antes da decisão final da Justiça.
Penas de 40 anos
O texto aumenta as penas para membros de facção ou milícia para 20 a 40 anos, podendo chegar a 66 anos para os líderes das organizações criminosas.
O substitutivo também aumenta em 85% da pena o tempo necessário para progressão de regime. Fica proibida graça, anistia, indulto ou liberdade condicional para membros dessas organizações.
Autonomia do MP
O texto prevê a participação do Ministério Público nos casos de forças-tarefas que investiguem facções, por meio de Procedimentos Investigatórios Criminais liderados por Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (GAECO).
Organização ultraviolenta
O projeto traz a definição de organização criminosa ultraviolenta, apesar das críticas que apontaram que a criação de um novo tipo criminal poderia gerar um caos jurídico nos processos judiciais que tendem a beneficiar os criminosos.
Sobre audiência de custódia e julgamento de homicídios cometidos por membros de facção criminosa, o projeto prevê que as audiências de custódia sejam realizadas, “em regra, por videoconferência, salvo decisão judicial fundamentada em sentido contrário”.
Os homicídios cometidos por facções serão julgados, no primeiro grau de jurisdição, por um colegiado e não por um tribunal do júri.
Apoio de Motta
Antes da votação, os deputados federais governistas chegaram a solicitar que o Projeto de Lei Antifacção (PL 5582/25) fosse retirado da pauta de votação na Câmara, em vista de que o texto original teria sido “desconfigurado” pelo parecer do relator Guilherme Derrite. No entanto, foi mantida a votação por 316 votos favoráveis contra 110.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos -PB), argumentou que o texto seria a resposta “mais dura” da história da Câmara dos Deputados no enfrentamento ao crime organizado.
“Nós estamos dizendo que chefes de facções criminosas agora irão direto para os presídios federais, que os encontros com advogados serão gravados, que não terão visitas íntimas”, exemplificou.
Motta afirmou que o projeto original do governo federal trouxe pontos positivos, mas que foram necessários mais olhares de outros setores e bancadas.
A Câmara denominou o substitutivo como “Marco legal de enfrentamento ao crime organizado”.